Análise: Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia (3DS) está entre o clássico e o moderno

Uma história simpática e mapas arcaicos.

em 01/06/2017

Em japonês, gaiden significa algo como "história secundária". Não sei quais são as implicações disso para Ninja Gaiden, mas para Fire Emblem Gaiden, lançado para Famicom em 1992, o significado se mostra muito claro. O segundo jogo da série tática da Intelligent Systems se passa no mesmo mundo que Archanea, onde reside Marth e ocorreram os eventos de Shadow Dragon and the Blade of Light (Famicom), mas conta a história do distante continente de Valentia. Além de local e elenco completamente distintos de seu antecessor, Gaiden apresenta um conjunto de mecânicas e regras que permanecem únicas ao longo de toda a série. Seguindo os sucessos dos Fire Emblem Awakening (3DS), Fates (3DS) e Heroes (iOS/Android), nos deparamos agora com Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia (3DS), um remake de Gaiden para a era moderna.
Ram Woods, 1992
Quando eu soube que haveria um terceiro jogo da série para 3DS (ou quinto, se levar em consideração as três campanhas de Fates), e um remake ainda por cima, minha reação foi a mais cética possível: parecia claro que a Nintendo apenas queria capitalizar no sucesso dos jogos anteriores e no público de Heroes com um lançamento relativamente rápido e barato de produzir. No entanto, ao começar a jogá-lo, minha impressão foi rapidamente invertida, pois é perceptível que o valor de produção do jogo não deixa a desejar comparado a Awakening e Fates, além de não ser um título para novatos da série.

Vamos elaborar. É fundamental destacar a qualidade da apresentação do jogo, com cutscenes pré-renderizadas, arte 2D de alta qualidade e diálogos completamente dublados. A história, centrada ao redor dos protagonistas Alm e Celica ao invés de um avatar do jogador, é interessante e repleta de personagens cativantes — ótimos personagens é uma característica da série, mas neste jogo senti mais ligação do que o normal com o elenco, possivelmente graças à excelente dublagem em inglês. É possível fazer diálogos avançarem automaticamente para assisti-los no ritmo das falas, tornando o processo muito mais natural que em outros Fire Emblem.

Ao mesmo tempo, me impressionei com o quanto Echoes é diferente dos outros Fire Emblem que joguei. A longa e verbosa introdução assemelha-se a um visual novel, as seções em vilas e cidades me lembram de Ace Attorney ou Professor Layton, enquanto as dungeons remetem a RPGs tradicionais. Isso impressiona porque, considerando a velocidade com a qual a Intelligent Systems lança jogos ultimamente, o esperado era apenas história e mapas antigos na base sólida de Awakening e Fates. Mas, se tratando de um remake do Fire Emblem mais diferente, Echoes acaba fugindo de muitos clichês da série.
Ram Woods, 2017. Parece familiar?
Por exemplo, enquanto geralmente personagens carregam até cinco itens, em Echoes eles podem carregar apenas um. Em compensação, atacar com espadas, arcos e magias não requer itens daquele tipo equipados. Itens podem ser armas que aumentam o poder de ataques, escudos que aumentam defesa, anéis que fornecem propriedades mágicas, ou comidas para recuperar vida. Desta forma, é bastante importante pensar cautelosamente no item que cada membro do seu exército levará para a batalha. É possível mudá-los durante a partida, mas apenas se o personagem estiver adjacente ao comandante, o que não é sempre viável. Recursos em geral também são relativamente escassos, então é igualmente necessário pensar bem em quais armas melhorar e quando gastar itens de cura.

Outra importante mudança são as dungeons, que podemos explorar com uma jogabilidade em 3D nunca vista na série, mas infelizmente com visuais pouco agradáveis e um curto alcance de renderização. Nesses locais, no entanto, encontramos inimigos (que permitem repetitivas batalhas para grind), tesouro e, possivelmente, estátuas da deusa Mila, padroeira do país Zofia. São com essas estátuas que podemos fazer nossos soldados mudarem de classe e, desta vez, várias unidades podem passar por três classes ao invés de apenas duas (por exemplo, Archer > Sniper > Bow Knight). Magos e arqueiros também têm alcance maior do que o normal, tornando-se unidades especialmente versáteis.

Todas essas diferenças trazem um frescor a uma série que está em uma perigosa zona de conforto. Por mais que se trate de um remake, quase ninguém jogou Gaiden, então suas características próprias servem como importantes quebras de paradigma para a maior parte dos jogadores de Fire Emblem. Mas, por outro lado, a adaptação de mapas clássicos não escondem a idade do design original. Um exemplo disso é o fato de que o objetivo de todos os mapas é "rout the enemy" (derrotar todas as unidades inimigos), carecendo então de objetivos mais interessantes. Mas, ao meu ver, o maior problema fica no design dos mapas em si.

Em geral, os mapas de Fire Emblem Echoes são divididos em duas categorias: mapas muito abertos com apenas florestas limitando movimento ou "ataques à fortaleza" nos quais há uma seção introdutória frequentemente vazia e uma construção de difícil acesso armada até os dentes . Ambos têm seus problemas quanto à estratégia do game. No primeiro caso, frequentemente é difícil atacar uma unidade inimiga sem simultaneamente colocar a sua unidade sob a mira de diversas outras. Em um jogo com permadeath, o resultado pode ser bastante desagradável. Em outros casos, há simplesmente muito espaço desperdiçado que apenas torna as partidas mais lentas. Esse tipo de mapa não é muito irritante por si só, mas é estranho que existam tantos deles no jogo.
A imagem é do Gaiden, mas esses mapas são replicados fielmente em Echoes.
O segundo caso me incomodou algumas vezes durante a campanha. Quando, narrativamente, o exército do jogador está prestes a invadir a base de algum inimigo, geralmente o mapa se configura em uma grande área ao redor da base e a base em si é repleta de inimigos. Em alguns casos, como em um deserto ou pântano, a mobilidade das unidades aliadas é seriamente comprometida até chegarem à construção, sendo alvos fáceis de magos e arqueiros inimigos. Em outros casos, o problema é invadir a base em si, pois escadas ou portas estreitas afunilam o exército e impedem que mais unidades ataquem simultaneamente. Novamente, os primeiros soldados a entrarem na base tornam-se alvos fáceis de vários inimigos, enquanto outros com menos defesa ou mobilidade mal têm chance de se juntar à ação. Muitas vezes, vários turnos são gastos simplesmente chegando perto dos inimigos ou arranjando o exército de uma forma sensata. Em compensação, as mecânicas e design do jogo me fizeram explorar mais habilidades que eu raramente aproveito em Fire Emblem, como Physic, Warp e Rescue, que me permitem auxiliar unidades à distância.
Novamente, exemplifico com uma imagem de Gaiden.
Essa abundância de funis pode levar a várias mortes frustrantes de personagens, mas Echoes apresenta uma mecânica (que não vem de Gaiden) para tornar essas situações mais palpáveis. Além do modo "Casual" já visto em Awakening e Fates, Echoes permite que o jogador volte no tempo — desfazendo comandos seus e do inimigo até qualquer ponto da batalha. Fãs fiéis podem considerar isso uma banalização da estratégia, mas eu vejo algo muito positivo nela: o jogador agora tem mais liberdade para experimentar estratégias alternativas e agressivas para entender e aprender seus resultados sem uma punição tão grave. Em outros FEs, mapas difíceis me obrigavam a jogar de forma extremamente segura (que também não é algo necessariamente ruim), mas agora me sinto mais à vontade tomando ações arriscadas que podem mudar o rumo de uma batalha. E, apesar da tentação ser grande, o jogador nunca é obrigado a tirar proveito da mecânica.


Em geral, o design das batalhas de Echoes se alinha com a filosofia do jogo, onde cada decisão pequena pode ser fundamental para a vitória. Inimigos podem parecer poucos, mas quase sempre estão arranjados em posições vantajosas para eles e problemática para o jogador. Recebemos poucas unidades ao longo da campanha (divididas em dois exércitos distintos) e é importante perceber rapidamente qual papel cada personagem deve desempenhar em um mapa. Mas, ao mesmo tempo em que Echoes incentiva a agressividade do jogador através de magias, arqueiros e invocadores que podem fazer estrago de uma posição segura, ele também o pune por enviar unidades ao ninho inimigo. Lidar com passagens estreitas, blocos que aumentam a chance de desvio ou unidades de longo alcance fornecem desafios interessantes, mas a minha impressão é que Echoes exagera no seu uso e nas combinações desses fatores. É um tipo de dificuldade muito diferente (e provavelmente mais justa) do que a sopa de atributos vista na rota Conquest de Fates, mas que ainda mereceria ajustes neste relançamento.

Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia é um intermédio entre o Fire Emblem moderno, o clássico e algo completamente diferente e, se apenas por isso, merece ser jogado pelos fãs da série, mas novatos podem manter a distância até conhecer outros jogos da franquia, justamente para apreciar essas diferenças. Em certos momentos, Echoes parece ser apenas um Fire Emblem novo e diferente mas, com mais frequência do que eu gostaria, os mapas de Gaiden entregam a verdadeira idade do game. A história de Alm e Celica não deixa de ser especial, mas não consigo deixar de sentir que ela teria se beneficiado de atualizações em seus confrontos.


Prós

  • Apesar de ser um remake, as mecânicas de Echoes são distintas e intrigantes;
  • Com raras exceções, a dublagem e a arte são excepcionais;
  • Boa história e personagens cativantes;
  • Mecânica de voltar no tempo promove estratégias mais criativas ou arriscadas.

Contras

  • Cenas em 3D são feias;
  • Vários mapas mereciam ser repensados;
  • O objetivo de todas as batalhas é "rout the enemy";
  • Frequentes batalhas com inimigos genéricos são repetitivas.
Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia — 3DS — Nota: 8.0 
Revisão: Pedro Vicente
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