Revisitando Hoenn, parte 1: de Treecko aos ginásios

Muitas pessoas estão empolgadas com os remakes de Ruby & Sapphire por serem seus primeiros jogos. Mas muitas dessas pessoas não acompanharam o lançamento.

em 10/07/2014
Finalmente os remakes de Ruby & Sapphire, títulos originalmente do GBA, foram anunciados. Já faz cerca de dois meses que os títulos foram anunciados e falta pouco mais de quatro meses para o lançamento. Nesse tempo eu estive lendo os manuais que vêm com o cartucho de GBA, foleando revistas antigas na tentativa de capturar aquele sentimento que foi o lançamento desses jogos naquela época. E bem, não há maneira melhor de fazer isso do que jogar minha versão Sapphire novamente. Nas semanas seguintes devo compartilhar essas experiências com vocês, começando por hoje. Quero contextualizá-los naquele lançamento há pouco mais de dez anos atrás.

Adeus Game Boy Color

Historicamente, pessoas são avessas a mudanças. Em uma proporção menor podemos ver isso em nossas vidas: você deve conhecer alguém que demorou, e muito, para atualizar a versão do Windows sobre a desculpa de "essa versão está boa, está tudo bem, ela está cumprindo com seu papel". Não vamos discutir aqui sobre como o Windows Vista é horrível, mas muitas pessoas ficaram paradas no Windows 98 (ou 95), e chegaram atrasadas no Windows XP, depois no Windows 7. Parece que pessoas apenas "trocam" (não apenas de sistema operacional) quando não é mais possível se manter na zona de conforto do antigo. Meu pai usa Windows XP até hoje. Essa ideia junto de outros fatores foi o primeiro grande problema de Pokémon Ruby & Sapphire em 2003 (apesar do título ser lançado no fim de 2002, chegou no Brasil no começo de 2003).

No Game Boy tínhamos Pokémon Blue e Red. O Game Boy Color, apesar de ser um outro portátil, ainda usava os mesmos jogos do Game Boy. O mesmo não acontecia com os jogos com "Game Boy Color" na capa, já que eles não funcionavam em um Game Boy tradicional. Isso só acontecia pelas cores mesmo. Tecnicamente, em questão de processamento, eram os mesmos jogos em essência. Então temos Pokémon Yellow, que é a mesma coisa dos títulos anteriores, mas com um inicial diferente (Pikachu!) e colorido. Em Pokémon Gold, Silver e Crystal, a situação ficou mais distante: não é necessária muita experiência em programação para ter uma noção de como o jogo está muito melhor trabalhado (não apenas visualmente). Agora temos 100 novos Pokémon, mas muitos dos Pokémon antigos ainda estão disponíveis pela região "selvagem" desse continente e treinadores usam Pokémon que já conheciamos em batalhas. Ao enfrentar os Gym Leaders e conversar com NPCs, encontramos muitas referências aos títulos anteriores, e quando chegamos nos Elite Four encontramos Koga, Bruno e Lance, que já são bem conhecidos por quem jogou os títulos anteriores. A maior surpresa é quando temos a oportunidade de viajar para Kanto, enfrentar todos os Gym Leaders que já conhecíamos e até encontrar um Snorlax bloqueando o caminho! Pokémon Gold, Silver e Crystal são novos jogos da franquia, mas funcionam como uma expansão dos anteriores, já que a história está diretamente conectada (e o ambiente também). Então estávamos jogando um jogo novo "só que não".


"Pokémon Advance", como foi conhecido na época, quebrava todo esse conforto.

Ir para Hoenn não foi fácil

As primeiras imagens que tivemos de Ruby e Sapphire pareciam muito promissoras. Vocês podem ver isso hoje como "nada", mas naquela época andar sobre poças d'agua, o reflexo do personagem nessa água, e as ondas criadas pelas pegadas, isso era incrível. Pegadas na areia também. A maneira como a porta do Pokémon Center abre (é uma porta automática) já era um sinônimo de algo futurista naquela época (e hoje cada esquina tem uma porta dessas). Lembrem bem, estamos falando de algo de mais de dez anos atrás. Uma época cujo a conexão Banda Larga não era comum, uma época na qual celulares tijolos eram muito caros e usavam antenas, uma época onde estávamos começando a conhecer PlayStation 2, GameCube e Xbox (e jogar online nesses consoles era um inferno, além de ter que pagar um provedor próprio). Outro detalhe simples: quando Ruby e Sapphire chegaram ao Brasil em meados de abril de 2003, foram seguidos pelo lançamento do Game Boy Advance SP no mês seguinte. Esse portátil não tem luz própria, mas tem uma iluminação que permite que você jogue no escudo: isso não era possível no primeiro modelo do Game Boy Advance, muito menos nos Game Boy anteriores (exceto com auxilio de bugigangas).


Então, vamos combinar aqui: eles pareciam jogos incríveis para aquela época. O problema começou quando os jogos foram lançados e realmente confirmamos que não era possível transferir nossos Pokémon nível 100 dos títulos anteriores para o atual. Se isso já não fosse possível em Gold/Silver, tudo bem, aceitaríamos melhor, mas como já provamos o sabor dessa experiência, isso foi uma frustração. Não tínhamos tantos vídeos naquela época, não existia YouTube (e nem Orkut!), o pouco que sabíamos era pela publicação nacional da editora Conrad, Pokémon Club, ou por sites como GameFAQs. E mesmo por esses meios foi confuso entender se poderíamos ou não transferir os Pokémon até o lançamento ocidental em 2003. A maioria das pessoas que jogavam Pokémon naquela época eram estudantes, não tinham renda própria, para conseguir um portátil novo teriam de conseguir com seus pais em troca de boas notas na escola ou favores domésticos. Então valeria todo esse sacrifício e esforço para conseguir um novo portátil que nem se quer poderíamos transferir nossos antigos Pokémon? O desanimo pelo esforço para conseguir um novo portátil  e não poder transferir os Pokémon que treinou até ali, foi o que fez muitos pararem de jogar Pokémon naquela época.


Vale lembrar que mesmo na série animada essa zona de conforto foi quebrada, pois é quando Misty e Brock abandonam Ash para ele ir a Hoenn (apesar de Brock voltar depois). Depois de cerca de cinco anos ao lado de Misty e ela simplesmente ir embora, não foi algo bem visto aos olhos dos fãs na época.

Um bom jogo

Mas passou. Foi uma fase difícil, mas também foi aqui que uma nova geração surgiu: e não falo do jogo, falo dos jogadores. Crianças mais novas conheceram a série animada nesse momento, outros começaram a jogar nessa época e aqui foi surgindo um novo público. Para aqueles mais antigos que ficaram, foi possível entender as Abilities (habilidades especiais que cada Pokémon possui), Natures (personalidade dos Pokémon que afetam diretamente o alcance de seus atributos), imagem de Pokéballs, animações de batalha, clima pelo cenário, a possibilidade de mergulhar no oceano, e todas as novidades fantásticas que o jogo apresentou.
Sheen: Naza, me lembre aqui o que mais tivemos de novo em Ruby e Sapphire.
Nota do revisor: Não sei, não joguei XD!
Sheen: Oh, certo, vamos deixar isso para os leitores.
Pois bem, foram bons títulos. Se não me engano foram os primeiros a serem alvos de "esse Pokémon parece digimon" ou "os 150 primeiros são os melhores, o resto é lixo". Entendo tudo o que foi dito até agora, vocês devem conseguir entender melhor isso. Pessoas não aceitam que outras tenham decisões diferentes das delas. É bem simples, elas precisam que os outros sigam o mesmo caminho que fizeram para confirmar que elas estão certas, já que estão inseguras sobre isso. É aí que temos bobagens como "A Nintendo é melhor que a Sony" (pois essa pessoa comprou um Wii e está insegura se ele é melhor, então precisa começar essa guerra), ou "meu time/religão é melhor que o seu/sua". Muitos dos que vi falando essas coisas sobre Pokémon foram aqueles que pararam de jogar, mas aparentemente lá no fundo não queriam abandonar aquele universo, então precisam fazer isso para que todos larguem Pokémon e ele não esteja sozinho. Para aqueles que na época argumentaram que "Pokémon é coisa de criança", hoje devo dizer que a maior fatia do público tem mais de 17 anos, e as "crianças" (10 anos?) têm interesse maior por Max Steel e Ben 10. Até Adventure Time, que também é uma série animada, tem como maior parte de seu público pessoas nessa faixa de idade (nota do revisor: inclusive eu! vejo todos assim que saem lá fora :P), pessoas que já têm sua independência financeira e/ou estão cursando ensino superior.


Visualmente foi um jogo muito bonito. Ele trouxe muitas mecânicas interessantes também, mas o problema voltou após completar a Pokémon League e participar de torneios jogando contra outros jogadores.

Relevância competitiva

Duzentos e dois (202!) Pokémon eram o que tínhamos de disponível na Hoenn Dex. Removendo Jirachi e Deoxys que eram Pokémon especiais de eventos, ficamos apenas com 200 Pokémon utilizáveis. Pouco mais da metade desses Pokémon eram novos monstrinhos da região Hoenn, e dentre os conhecidos nas regiões anteriores, não tínhamos muitas opções interessantes (Zubat?). Não é muito comum encontrar Cacturne, Delcatty, Swalot, Grumpig ou Tropius em batalhas hoje em dia, e sei que aparecerá algum bobão falando "huur duur, mas eu uso" - parabéns, mas estou falando que eles não estarão em uma lista dos 10 Pokémon mais usados em batalhas online (seja em simuladores ou no 3DS). Vocês sabem que o potencial de combate desses Pokémon é inferior ao de alguns outros. Seja por atributos, seja pelos golpes que têm disponíveis para aprender, seja por qualquer outro aspecto. Mas naquela época "é o que tem pra hoje". Ainda em meu cartucho de Pokémon Y do 3DS, eu tenho uma Delcatty que usei muito em batalhas de Pokémon Sapphire. E não era um Pokémon "ruim" na época, mas eram batalhas em um nível totalmente diferente do que estávamos acostumados no final da segunda geração.

Lembro de conversar com o Camarossi, meses atrás, sobre como Sceptile era realmente bom no começo de Ruby e Sapphire. Ele não tinha muitos Pokémon para dar um fim em sua matança. Ele era mais rápido que a maioria dos Pokémon disponíveis, além de bater forte. E falando em "ser rápido", Ninjask era um deus (hoje não é tão visto também) por seu exclusivo Speed Boost garantindo um Baton Pass mais efetivo. Sableye, apesar de voltar a ser usado com adição de Prankster, ele estava esquecido desde Ruby e Sapphire. Shedinja era um pesadelo para muitos. Com o lançamento de Pokémon Colossem (GC) foi possível obter alguns Pokémon diferentes, mas nada muito incrível. A grande mudança veio com os remakes de Kanto, os jogos FireRed e LeafGreen, que trouxeram de volta Blissey e tantos outros Pokémon que estávamos acostumados na segunda geração. Isso mudou bastante o sofrido cenário competitivo que Hoenn teve, mas ao aprofundar nisso, nós já estaríamos falando de outros jogos.
Em pouco mais de quatro meses teremos a oportunidade de conhecer uma nova Hoenn. Por agora eu recomecei minha jornada no título original e recomendo que façam o mesmo para que possamos compartilhar experiências sobre nosso progresso, coisas interessantes que encontrarmos pelo caminho, e claro, refrescar a memória para nova Hoenn que está por vir. Como o título sugere, eu não devo seguir o caminho clichê do inicial de fogo, e também evitar o caminho carismático do inicial de água. Escolhi o caminho mais estiloso, com sua folha na boca, o melhor dos três. Não esqueçam de enviar suas dúvidas para mim e para nossa deusa acima dos paraísos, A Pedra.

Recado do autor

Saudações, treinadores! O que vocês têm jogado atualmente? Parece que muitos têm abandonado seus Pokémon em Kalos e jogado apenas durante eventos. É compreensível e válido. Ainda mais com excelentes lançamentos depois de Pokémon como The Legend of Zelda: A Link Between Worlds (que meu amigo Kennio já está cansado de jogar), Bravely Default (um dos melhores títulos de 3DS em minha opinião), Mario Golf: World Tour (franquia que nosso chefe Estrella adora) e até o recente Kirby: Triple Deluxe (que sei que a senhorita Taíse está caída de amores). Eu ainda tenho que terminar esse Zelda (é sério, League of Legends tem tomado muito de meu tempo). Mas se você está sem um bom título para jogar, Geekverse tem ótimos títulos à disposição, especialmente os lançamentos mais recentes. Isso se sua carteira estiver respirando depois da Summer Sale do Steam.

Mas o que venho falar para vocês hoje é que não esqueci do concurso de moda. Estou trabalhando isso nos bastidores e logo teremos a divulgação do evento. Se você não sabe o que estou falando, leia a coluna da semana passada e fique por dentro. Minha previsão é para depois do Anime Friends, então sejam pacientes. Em tempo, agradeço todos que colaboraram suas dicas, sugestões e pontos de vista sobre como podemos realizar esse concurso. E como dito semana passada: se você sabe desenhar bem, deve se preparar também.

Curiosidade da Semana

Na "geração advance" fomos introduzidos ao e-Reader. Um acessório que poderia ser conectado ao Game Boy Advance para ler cartas de Pokémon. As coleções de Pokémon Trading Card Game da época começaram a vir com esse "código de barras" em sua lateral e na maioria dos casos adicionavam conteúdo simples ao jogo como itens (berries, poções). Entretanto, existiam cards especiais que adicionam novos treinadores ao jogo, as vezes usando Pokémon que não eram vistos naquela versão (exceto se você trocasse com um amigo que tivesse a outra versão baseada em Hoenn). Essas cartas de "batalha" (treinadores por DLC?) tinham exclusivamente essa função, então não serviam pro proposito do TCG. Alguns Pokémon de evento (Deoxys, Lugia e Ho-Oh em FRLG, Mew em Emerald, Latios/Latias em Ruby/Sapphire) eram obtidos por esse meio.

Nota do revisor: Pô, seria muito legal se eles fizessem isso nesse remake, talvez por QR Code ou com a câmera de realidade aumentada através de mini-games!

Revisão: Leonardo Nazareth
Capa: Douglas Fernandes

Escreve para o Nintendo Blast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.