O dia em que meus Pokémon fizeram a alegria de um garotinho

Jogar Pokémon aos 30 e topar com um pequeno fã da série pode ser um dos encontros mais inesperados e tocantes do dia.

em 28/05/2014

Sempre que vou para algum lugar, levo meu 3DS a fim de ocupar os longos tempos de espera e viagem na capital paulista. Certo dia, como de costume, estava jogando Pokémon X enquanto aguardava o trem. Um menininho, com seus dez anos, saiu de não sei de onde e “grudou” ao meu lado. Crianças assim costumam me deixar um pouco irritado, mas essa não parava: "que videogame é esse? Isso é Pokémon? Que pokémon é esse?". Não sei como não fui um ranzinza chato.
Lembrei de quando tinha a idade dele. Na época, a febre dos monstrinhos de bolso tinha acabado de começar e a crise dos anos 1980 estava no fim. Quem estava se recuperando da época dos cruzeiros sofria para se dar ao luxo de comprar videogames para seus filhos, como era o caso da minha família, e parecia que aquele menino também estava nessa situação. Então, como a maioria da molecada que assistia ao anime na Record e babava por tudo relacionado à série, qualquer pessoa com um Game Boy na mão era motivo de inveja e curiosidade. O jeito era ir na casa daquele amigo mais abastado tirar algumas batalhas de Pokémon Stadium, ou grudar ao lado de quem estivesse jogando.


Não demorei muito para ter empatia. Sempre fui muito ciumento com meus videogames, meus sobrinhos e primos menores sabem o quão chato sou quando o assunto é emprestar jogos (jamais esquecerei o primeiro “save acidental” no meu Pokémon White, causado pelo irmão caçula). Mas o garoto praticamente agarrou o 3DS das minhas mãos quando o ofereci e embarcamos juntos no trem. As perguntas não paravam, talvez ele ainda não conhecesse a sexta geração e certamente passou longe da primeira, algo pré-histórico para a garotada atual.


Expliquei que o Arcanine era a evolução do Growlithe, como ele evolui e como é super efetivo contra oponentes do tipo gelo. Apresentei meu time, seus olhinhos brilhando como se nunca tivesse pegado um videogame na vida. Quando passei o jogo pra ele, estava no meio de uma batalha com um treinador.

- Nossa! Um Blastoise!
- Aperta esse botão aí embaixo, ele vai evoluir!
- Ele evolui de novo! Que da hora!

Ele destruiu o treinador adversário e seguiu para o primeiro mato que viu para capturar alguns pokés.
Na hora de desembarcar, bolei um plano ousado para recuperar meu portátil sem criar situações embaraçosas: fucei na mochila e encontrei um chaveiro do Abra, presente de uma amiga, e tentando não ser muito apegado, ofereci ao menino. Ele o agarrou da mesma forma que pegou meu 3DS, perguntando qual monstrinho era e o que ele fazia.
- É um Abra. Um pokémon psíquico, ele dorme o dia todo e só acorda para se teletransportar na hora do perigo.
- E como ele evolui?

Foi aí que me senti um verdadeiro velho. Na idade dele, todos me diziam que precisava estudar para ser alguém na vida, e de alguma forma queria passar isso ao garoto. Usando uma voz parecida com a do Professor Carvalho, expliquei:

- O Abra é muito inteligente. Para ele evoluir, seu treinador precisa ser mais inteligente que ele. Você sabe como consegue ser mais inteligente que ele?
- Estudando?!
- É isso aí, até mais!

Desembarquei com meu 3DS e uma pontinha de alegria. Não sei se ele vai virar médico e/ou mestre pokémon, mas acho que fiz o dia de alguém.


Com trinta anos nas costas, jogar videogames para crianças às vezes me faz esquecer de como elas conseguem ser tão felizes com coisas tão bobas, como jogos e chaveiros. Lembro de como chorava de birra para meus pais comprarem um jogo ou brinquedo caríssimo, e como fui sortudo por eles conseguirem comprar. E pensando em como alguns não possuem a mesma sorte, resolvi andar com mais chaveiros do Pokémon na bolsa, só no caso disso acontecer de novo.

Revisão: Bruna Lima
Capa: Paula Beltrão

Escreve para o Nintendo Blast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
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