Em minha longa jornada de vida gamística presenciei muitos
momentos marcantes: como a era de ouro dos videogames, em que a Nintendo e a
Sega se digladiavam por uma fatia do mercado; o lançamento de The Legend of Zelda:
Ocarina of Time, jogo que, até hoje, é visto por muitos como o melhor já criado
em toda a história e a queda e ascensão da Nintendo em sua batalha feroz contra
a Sony. Por todos esses anos, poucas experiências me marcaram tanto como Animal
Crossing. A franquia, que teve seu primeiro título, Animal Forest, lançado
inicialmente apenas no Japão para o Nintendo 64, só deu as caras por essas
bandas com o lançamento de um port desta versão para o GameCube.
A gigante japonesa vendia a experiência como um novo gênero,
chamado de “comunicação”, e afirmava que o funcionamento e apelo do título só
seria realmente compreendido por aqueles que dessem uma chance ao jogo. Foi
quando eu decidi arriscar e descobrir do que se tratava aquele jogo que
aparentava não ter nenhum propósito ou razão de existir. A decisão foi uma das
mais acertadas desde que comecei a jogar videogames, e Animal Crossing se
mostrou não apenas um excelente jogo, como também uma experiência adorável e profunda,
capaz de transcender tudo o que sentimos jogando videogames, dando ao jogador
uma segunda vida que ele realmente se importa em viver e ser feliz.
Um passeio matinal pela vila |
Apesar das centenas de horas que passei me divertindo com a
versão de GameCube, por alguma razão me afastei um pouco da franquia nos
lançamentos seguintes, Animal Crossing: Wild World e Animal Crossing: City
Folk. Entretanto, algo mudou quando New Leaf foi anunciado para 3DS, e algo me
dizia que era o momento certo de retornar com força total para a franquia que me
fez tão feliz outrora. Ainda bem que a minha intuição estava correta...
A magia da simplicidade
Antes de tudo, Animal Crossing é uma experiência que envolve
os jogadores de forma única, e muito do que for dito nessa análise empolgará
apenas os já entusiastas da franquia. Então, peço para que os leitores abram a
cabeça e não deixem o título passar batido, pois estarão perdendo o que pode
ser facilmente o melhor jogo lançado até agora para a já espetacular linha de
títulos do pequeno notável da Nintendo.
Personagens já conhecidos como Gulliver retornam mais uma vez! |
Dito isto, em Animal Crossing você controla um novo morador
de uma vila bucólica (a qual o jogador decide o nome), habitada por adoráveis
animais que estão lá apenas para viver suas vidas. O jogo não dá objetivos
claros ao jogador como estamos acostumados na maioria absoluta dos jogos e cabe
a você decidir como viver a sua vida. O jogo tem seu relógio sincronizado com o
do “mundo real”, de forma que se você ligar o jogo em um sábado à tarde durante
o verão, é exatamente isso que encontrará em sua vila. Animal Crossing se
aproveita do relógio para ditar o que está acontecendo na vila: se jogado de
madrugada, as lojas estarão fechadas e os habitantes, provavelmente, dormindo.
Mas ainda assim, é possível encontrar itens que não podiam ser encontrados, por
exemplo, em uma manhã. E aí está boa parte da genialidade da franquia: o
jogador sempre voltará para descobrir coisas novas em sua cidade, bem como
estreitar os laços com os habitantes e ter uma vida cada vez melhor.
Os eventos e visuais mudam de acordo com a estação do ano |
Um dos maiores focos de Animal Crossing é a coleta de itens:
sua casa (que pode ser expandida, se pagas taxas a Tom Nook, o guaxinim
construtor da cidade), pode ser inteiramente customizada, desde os móveis até o
piso e papéis de parede. Suas roupas, acessórios e cabelo também podem ser
mudados a qualquer momento, inclusive sendo desenhadas pelo próprio jogador,
caso deseje, e os habitantes perceberão e comentarão as mudanças, sempre com
textos adoravelmente engraçados. Além disso, ainda é possível pescar uma
infinidade de espécies diferentes de peixes, caçar insetos e até mesmo
descobrir fósseis. Tudo isso pode ser doado ao museu da cidade, que ficará cada
vez mais belo e completo com suas generosas doações. Como se não bastasse, é
possível ajudar seus vizinhos em tarefas cotidianas, escrever-lhes cartas (que
serão retribuídas com presentes e melhores relacionamentos), e até participar
de comemorações a feriados, como o Natal e outros eventos.
"Eba, suco!" |
Como se pode notar, a franquia lhe dá uma infinidade de
coisas a se fazer, mesmo que elas não apresentem algum real desafio ou
recompensa, e isso pode afastar muito os jogadores. Acontece que Animal
Crossing é um jogo que tenta ser a “Amélie” dos jogos, de maneira que o jogador
se envolve tanto com aquela segunda vida que passa a dar valor para a menor das
conquistas, que sempre passarão sensações únicas e prazerosas (você perceberá
isso quando conseguir plantar alguma fruta diferente da dominante em sua
cidade: é ridiculamente simples e, ao mesmo tempo, extremamente gratificante).
Assumindo o controle
Dito isto, o que New Leaf traz de novo que torna necessária
a migração para a nova versão? A resposta é: muita, mas muita coisa mesmo! Em
primeiro lugar, as funcionalidades online, que já eram características das duas
versões anteriores foram refinadas ao extremo, e a interação com jogadores que
habitam outras vilas é gigantesca! É possível trocar todo tipo de item,
estabelecer relacionamentos com outros habitantes e até mesmo participar de
minigames extremamente divertidos que retratam bem a simples e pacata vida que
você leva em sua cidade.
Você poderá receber visitas de seus amigos do 3DS! |
Em segundo lugar, a zona comercial da cidade, introduzida em
City Folk, retornou, mas de forma mais simplificada, lógica e divertida. Para
chegar até esta parte de sua vila, basta atravessar os trilhos de trem que lhe
trouxe até lá. Todos os estabelecimentos já conhecidos estão lá, e ainda é
possível construir novos locais (como uma danceteria em que o amado KK Slider é
DJ). O que muda mesmo é a forma de interação com esse e os outros pontos de sua
vila, que é justamente onde New Leaf brilha sobre seus predecessores. Pela
primeira vez, o jogador não só é um habitante da cidade, como também é
prefeito! Sendo assim, cabe a você desenvolver não apenas sua casa e seus
relacionamentos, mas também toda a cidade. Todas as vilas contam com uma
prefeitura, em que sua conselheira - a adorável cachorrinha Isabelle – lhe
informará sobre seu nível de aprovação e o que pode ser feito para tornar a
cidade um lugar melhor. Com isso, é possível construir novas estruturas, como
poços e outras coisas que tornem a vida dos habitantes ainda melhor.
"Em minha gestão, plantarei árvores com todos os tipos de fruta!" |
Com o tempo, você ganhará mais respeito dos animais da vila,
outros se mudarão para lá e trarão novidades, como novos itens e mais coisas
para fazer. Entretanto, habitantes insatisfeitos também podem deixar a cidade
e, acredite, as despedidas podem ser dolorosas caso seu nível de apego a eles
já seja grande (nunca vou me esquecer quando o crocodilo Boots deixou minha
cidade na versão de GameCube).
Logo no início, ocorre a cerimônia de posse da prefeitura da cidade |
Com essa nova dinâmica, o jogo, que já oferecia uma
infinidade de coisas para fazer, praticamente dobra suas atividades, de maneira
que é bom você começar a abrir mão de sua vida caso queira ter um bom progresso
no jogo. Apesar de ter exagerado, é bom ressaltar que Animal Crossing exige um
bom nível de dedicação (preferencialmente diária). Então, o jogo não é muito
indicado para os que não têm muito tempo para jogar. O jogo vai continuar sendo
excelente, mas não será possível aproveitá-lo em toda sua plenitude.
Dava pra ficar mais adorável?
A resposta é um SIM (gritado mesmo)! Animal Crossing sempre
foi lindo, não por seus gráficos ultrarrealistas, mas por seu estilo artístico
singular e carisma de seus personagens. Contudo, a Nintendo caprichou muito
nessa versão, como as texturas dos personagens que estão mais bem definidas (é
possível até ver os pelinhos dos animais). Os cenários também estão mais belos
e cheios de detalhes e o destaque fica para a água, cristalina e crível como
nunca antes vista na franquia.
K.K. Slider retorna com suas músicas adoráveis |
Os personagens ainda soltam grunhidos hilários quando falam,
sendo que cada um tem uma voz e um estilo diferente de expressar suas ideias.
As músicas, que ainda mudam a cada hora do dia que passa, estão calmas,
relaxantes, bonitas e viciantes, passando um clima delicioso de nostalgia e
tranquilidade. O maior destaque fica para as músicas tocadas durante as
madrugadas: lindas e serenas, elas embalam as pescarias, caçadas por vagalumes
e outros insetos menos vistos durante o dia. Nota-se facilmente que a Nintendo
se empenhou como nunca na produção do título, já que tudo foi feito com muito
esmero para envolver os jogadores o máximo possível com a experiência única que
o jogo oferece.
Os gráficos estão mais detalhados |
Para a vida toda
Animal Crossing: New Leaf oferece conteúdo para centenas e
até milhares de horas. Mesmo que de vez em quando as sessões de jogo se limitem
a quinze ou vinte minutos (acredite, os habitantes da vila até se cansam de
você se seu personagem ficar circulando por lá o dia inteiro), você sempre
desejará voltar para redescobrir sua cidade, colher algumas frutas ou conseguir
novas roupas para seu personagem. A partir do momento em que jogador for
envolvido pelo título, não há como voltar atrás e perguntas como “o que eu
fazia antes de Animal Crossing?" começarão a surgir em sua cabeça.
"Hora de brincar no parquinho!" |
O melhor jogo de 3DS?
O 3DS já conta com uma biblioteca invejável de jogos e New
Leaf é, certamente, o melhor lançamento do portátil até agora. O jogo pegou tudo
o que foi criado durante esses doze anos da franquia e a refinou ao extremo,
excluindo qualquer defeito das versões anteriores e adicionando elementos
incríveis de jogabilidade. Além disso, o jogo oferece infinitas horas de
diversão e um mundo que se renova e se torna mais apaixonante a cada nova
partida. Atualmente, poucos jogos conseguem capturar a essência dos videogames
quando eles foram criados e, quase nenhum, consegue criar uma sensação de
prazer e conquista tão grande ao jogador. Felizmente, Animal Crossing: New Leaf
consegue as duas coisas, com louvor.
Prós
- Mundo imersivo;
- Gameplay infinito;
- Personagens adoráveis;
- Modo online bem implementado;
- Ser prefeito adiciona mais conteúdo a um jogo praticamente infinito;
- Gráficos lindos;
- Trilha sonora fantástica.
Contras
- Estou tentando pescar um até agora.
Animal Crossing: New Leaf – 3DS – Nota 10.0
Revisão: Jaime Ninice
Capa: Felipe Araújo