Blast from Japan: Fire Emblem: Thracia 776 (SNES)

em 23/02/2013

Neste mês fomos agraciados com Fire Emblem: Awakening , o mais novo título da longa série de RPG Tático da Nintendo, que está arrasando q... (por Lucas Palma Mistrello em 23/02/2013, via Nintendo Blast)

Neste mês fomos agraciados com Fire Emblem: Awakening, o mais novo título da longa série de RPG Tático da Nintendo, que está arrasando quarteirões no Nintendo 3DS. Em grande parte pelas novidades gráficas e de mecânicas de jogo implementadas no já consagrado sistema de batalha. Antes dele, um dos jogos da série que mais inovaram nesse sentido foi o curioso Fire Emblem: Thracia 776, lançado em 1999 e re-lançado em 2000 para o Super Nintendo. Foi o último jogo do SNES a ser lançado na história. Conheça um pouco mais sobre este interessante título da seguir.

23 anos de história que ainda não são para todos

É bem provável que Fire Emblem continuasse anos e anos ainda restrito ao Japão se não fosse a participação de Marth e Roy (protagonistas do primeiro e último, até então, jogos da série) em Super Smash Bros. Melee, lançado para Nintendo GameCube em 2001. Mas, felizmente, os tempos são outros, desde então quase todos os títulos das série também foram lançados no Ocidente, e ela já se tornou uma das mais queridas do público nintendista de olhos mais abertos.

No entanto, um fato que chateia imensamente todos os fãs de Fire Emblem deste lado do globo foi o fato de que os jogos anteriores (especificamente os de Nintendo e Super Nintendo) não terem chegado por aqui no Virtual Console do Wii - enquanto todos foram lançados na sua contraparte japonesa. O único dos títulos iniciais que chegaram à terra do sol poente foi o primeiro, Fire Emblem: Ankoku Ryû to Hikari no Tsurugi (algo como Fire Emblem: O Dragão das Sombras e a Lâmina de Luz), na forma de seu remake, Fire Emblem: Shadow Dragon, lançado para o Nintendo DS em 2008.

Os motivos para os jogos não atravessarem o globo no Virtual Console são provavelmente os mesmos de Fire Emblem: Shin Monshô no Nazo: Hikari to Kage no Eiyû (O Novo Mistério do Emblema: Heróis da Luz e da Sombra) - lançado para o DS em 2010, seqüência direta de Shadow Dragon e remake do terceiro título da série, originalmente do Super Nintendo - também não chegar: eles são desconhecidos. A política da nossa Big N na localização dos jogos sempre foi extremamente cautelosa e ainda que tenha seus tropeços, ela sabe o que faz. Isso não pode ser medido pelos jogos de sucesso que não recebemos aqui, como Fire Emblem ou EarthBound, no caso mais controverso. E sim devemos perceber isso pelo fato de que poucos jogos dela (de firsts ou seconds) que fazem a travessia transcontinental são fracassos comerciais, assim como no caso dos periféricos dos consoles.

Pois bem, é triste não poder conferir os jogos anteriores de uma série porque ficamos impedidos de acompanhar toda a evolução da série. Não conseguimos ver a inclusão e o desenvolvimento de novos conceitos e aspectos da jogabilidade, ou seja, pegamos o bonde andando.

Imaginem se conhecêssemos Zelda apenas partir de Majora's Mask?

Fire Emblem: Awakening, último título da série, e provavelmente melhor jogo do Nintendo 3DS da vida do console até o momento, está sendo um divisor de águas dentro da trajetória iniciada pelo príncipe Marth há 23 anos. Incluiu diversas novidades e novas abordagens no consagrado sistema de batalha. Mas, antes dele, um jogo em específico também teve um papel semelhante, Fire Emblem: Thracia 776, lançado em 1999 (depois relançado em 2000) para o Super Nintendo.

Nintendo Power

Não, não é um novo grito de guerra exaltando meu amor pela Nintendo. A história de Thracia 776 já se inicia curiosa pelo seu lançamento. Ele foi um dos raros jogos disponibilizados exclusivamente pelo periférico  do Super Nintendo, Nintendo Power, restrito ao Japão. O Nintendo Power foi o principal ancestral do nosso atual Virtual Console. Tratava-se um cartucho com uma placa de memória flash capaz de ser regravável indefinidamente. Os jogadores adquiriam um cartucho em branco e posteriormente precisavam ir às lojas credenciadas pela Big N para fazerem o download de novos jogos ou substituir o que lá estavam. Funcionou na época como medida anti-pirataria.

Versões para SNES e GB
Thracia 776 foi lançado já nos últimos e derradeiros suspiros do Super Nintendo, já em 1999 através deste serviço e, logo depois, chegando as lojas normalmente como cartucho único no ano 2000. Sendo, então, o último jogo lançado para o console oficialmente. (Lembrando que desde 99 não só já estávamos completamente entretidos com o Nintendo 64, como já está em desenvolvimento o Projeto Dolphim, que se transformaria mais tarde no GameCube).

No ano de 776 do Grande Calendário

Uma outra particularidade deste título é por ele ser o único da série, até o momento, de possuir uma estória especialmente desenvolvida dentro do enredo de outro jogo. Enquanto o segundo título, Fire Emblem: Gaiden (NES/1992), contava uma história paralela ao primeiro, o enredo deste aqui se desenvolve especificamente entre os capítulos V e VI do antecessor, Fire Emblem: Seisen no Keifu (Descendentes da Guerra Santa - SNES/1996).

Neste último jogo citado, todo o continente de Judgral com dezenas de condados e reinos - fundados por descendentes de grandes cruzados do passado - combatem entre si para evitar que os seguidores de um antigo deus maligno - o qual os cruzados combateram no passado - conquistem a maioria dos países. Eventualmente, na metade daquele jogo, eles completam esse objetivo. Neste ponto ocorrem os eventos de Thracia 776: um dos reis envolvidos na guerra, Lenster, é morto durante uma das batalhas. Na península de Thracia, o reino homônimo sempre desejou conquistar os pequenos castelos do distrito de Manster. Com a chegada dos vilões do poder, nos eventos de Descendentes da Guerra Santa, o Rei de Thracia, apoiado pelo maligno imperador Alvis (vilão principal daquele título) consegue finalmente concretizar sua ambição e conquista o distrito.

O distrito era sempre protegido pelos guerreiros do castelo de Lenster, liderados pelo bom rei, com o mesmo nome, Lenster, descendente do cruzado Noba e morto durante a Guerra Santa. Assim que o rei de Thracia, Bloom, conquista o distrito, sua primeira atitude é destruir o castelo, como maneira de demonstrar seu poder, matando também Quan, filho e sucessor de Lenster. O que ele não contava era o fato de que o filho de Quan e neto de Lenster, príncipe Leif, conseguisse escapar, sendo criado pelo nobre guerreiro de Leonster, Fin.
Fin escapando com Leif nos braços
A partir daí já sabemos muito bem o que acontece, Leif, mais velho e maduro decide enfrentar o rei usurpador Bloom, e seu comandado, Bispo de Lopto, Veld, e reaver o distrito em nome do pai e do avô no ano de 776. Eventualmente o enredo deste converge com o do antecessor e Leif se envolverá na Guerra Santa.

Inclusões que dificultaram até demais.

Dentre todos os títulos da série, Thracia 776 é considerado o mais realista e talvez o mais difícil. Isto devido as suas inúmeras variáveis nas batalhas que foram introduzidas nele. Algumas permaneceram na série, mas outras se tornaram únicas. Das que "morreram" com esse título destaca-se a fadiga.

Leif, o protagonista.
Exatamente, fadiga, como maneira de obrigar o jogador a usar um número maior e mais variado de personagens (e não apenas focar todo o treinamento e experiência em apenas alguns). Cada um tinha uma capacidade diferente de agüentar mais ou menos batalhas em seqüência. E era um cálculo bastante complexo. Dependendo das atividades que o personagem fazia na batalha (atacar, se movimentar, usar itens, defender e etc.) ele acumulava pontos de fadiga, e quando estes pontos ultrapassavam a quantidade de HP daquele personagem, ele ficava impedido de participar do próximo capítulo. Claro que existiam itens capazes de diminuí-la.

A medida, apesar de interessante para balancear o jogo, se tornou bastante impopular e num mais retornou à série. Com um número tão grande de personagens controláveis, ficou difícil de gerenciá-los, quais utilizar nas batalhas e a dificuldade de organizar o treinamento de tantos guerreiros simultaneamente. Assim como o fato de que os capítulos de Fire Emblem têm diferentes intervalos entre si. Alguns ocorrem logo em seguida do anterior, enquanto outros acontecem tempos depois. A fadiga, fica, em certo ponto, até incoerente com a própria estória do jogo.

Duas outras coisas que foram introduzidas e ficaram mesmo por Thracia 776 foram: a possibilidade de capturar os inimigos após derrotá-los, o que, por sua vez, tornava possível roubar itens do guerreiro derrotado - algo que os inimigos poderiam fazer com você também; e a obrigatoriedade dos guerreiros que usam montarias (cavalos ou pégasos) ficaram a pé em mapas que ocorrem dentro de alguma construção. Obrigando-os a utilizarem armas diferentes.


Não satisfeitos com a dificuldade até então, também foi introduzida neste título a "Fog of War", que chegou a figurar em outros jogos da série como Fire Emblem: The Sacred Stones (GBA/2004 e 2005). A neblina ou sombra de guerra é aquela sombra que se estende ao longo do mapa longe dos personagens controláveis (algo comum na série Age of Empires), e no caso deste Fire Emblem foi usado em alguns mapas ocorridos a noite. Algo bem interessante, pois contava ainda com a possibilidade de se utilizar tochas para aumentar o campo de visão, e que, claro se desgastavam com o passar dos turnos.

Inclusões duradoras

Embora várias das características que contribuíram para dificultar e tornar o jogo mais complexo desapareceram ou voltaram em doses homeopáticas nos demais títulos, outras tantas começaram com Thracia 776 e continuaram na série. Uma das principais foram os capítulos bônus, aquelas batalhas que são paralelas à estória principal do jogo e que você tem acesso apenas cumprindo certas condições. Algo novo também foi a possibilidade de resgatar demais personagens. Caso algum de seus comandados fique muito ferido, é possível que outro (caso tivesse o peso maior que o resgatado) passasse a carregá-lo pelo mapa a custo de menor mobilidade.

O Calabouço, o quarto mapa de Thracia 776, e o primeiro de todos os Fire Emblem a ter objetivo diferenciado. Aqui é necessário resgatar Leif que está preso e fugir do calabouço antes que mais reforços cheguem.

Mas a grande contribuição deste jogo no universo de Fire Emblem foram as novas condições de vitória. Até o quarto Fire Emblem (Descendentes de Guerra Santa) todos os mapas terminavam quando os castelos eram conquistados (atual seize victory). Aqui os outros tipos de objetivo foram introduzidos, algo que fez tanto sucesso que passou a ser incluído até mesmo nos remakes dos jogos antigos. Foram apresentados mapas de escapada, onde era necessário levar todos os personagens ao ponto de fuga, e os mapas de resistência, onde era preciso agüentar os ataques inimigos por um determinado número de turnos.

Existiram também outras alterações menores, como um número mais variado de armas únicas e maior número de personagens capazes de forneceram pontos bônus por liderança, ou capacidade de treinar certos atributos ou melhorar habilidades para além das promoções. Coisas que mudam sempre de um Fire Emblem para outro.

Um jogo único em todos os sentidos

No geral, Fire Emblem: Thracia 776 (776 é o ano em que se passa a estória) é o título mais difícil e provavelmente o mais influente da história da série dentro das mecânicas de jogo. Muitos dos vários conceitos consagrados atualmente na jogabilidade da série foram introduzidos ou melhorados com este jogo. Mas talvez o fato de terem sido lançadas tantas novidades ao mesmo tempo teve o efeito contrário, dificultando demasiadamente para os jogadores acostumados com a jogabilidade até então.


A dificuldade extrema fez com que algumas das interessantes inclusões, como a Fog of War e a fadiga ficassem com uma imagem, a princípio, negativa, como um capricho desnecessário e dificultoso. E assim, foram ou deixadas de lado ou então colocadas timidamente nos jogos posteriores.

Fin
Claro, isso sem levarmos em conta que o jogo foi lançado para o Super Nintendo quase uma década depois do lançamento do console por lá, e bem no meio da vida útil do Nintendo 64, ou até mesmo no declínio deste último se consideramos que o GameCube já se encontrava em desenvolvimento. Infelizmente, todos estes fatores fazem com que Thracia 776 seja um daqueles jogos que se torna extremamente cultuados e importantes, mas apenas para os fãs mais fiéis de uma franquia.

Dificilmente um fã ocasional, ou menos aficionado, de Fire Emblem se interessará por ele, ou até mesmo conseguirá jogá-lo até o final; ou ainda um fã ocasional de RPGs Táticos (um dos gêneros mais restritos de popularidade devido ao tempo que consome do jogador) conhecerá a série por ele. Isso tudo agravado, claro, pela inexistência de uma tradução oficial em inglês e a dificuldade de consegui-lo por meios legais. O que por sua vez, também ocorre pela falta de interesse da Nintendo em fazer a localização justamente pelo fato de ser um jogo tão peculiar e difícil, uma aposta não tão segura de sucesso.

O lugar de Thracia 776 realmente parece ser o de colunas de sites de games exaltando seu valor, dificuldade e importância.


Fire Emblem: Thracia 776. Super Famicom, Nintendo/Intelligent Systems. 1999


Revisão: Leandro Freire 



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