Analógico: A importância da vida nos games

em 02/11/2012

Você sabe quanto vale a sua vida? Embora seja bastante, não conseguimos calcular muito bem. E você tem ideia de quanto vale uma vida no mu... (por Fábio Garcia em 02/11/2012, via Nintendo Blast)

Você sabe quanto vale a sua vida? Embora seja bastante, não conseguimos calcular muito bem. E você tem ideia de quanto vale uma vida no mundo do Mario? Essa resposta todo mundo tem na ponta da língua: cem moedas. As vidas nos jogos são elementos muito importantes para a jogabilidade, e a maneira como estão dispostas pode revelar as intenções dos produtores. Na matéria de hoje, aproveitando o dia de finados, vamos conversar um pouco sobre a vida nos games e discutir o que ela representa para o jogo em si.

Para quê existem as vidas?

Antigamente era muito mais comum você jogar videogames em locais especializados, como as casas de arcade (conhecidas como “fliperamas” no Brasil por alguma razão misteriosa), do que em sua casa. Carregado de moedas, o jovem ia até aquele local e gastava toda a sua mesada comprando fichas que lhe garantiam novas tentativas em Pac-Man ou Donkey Kong. Veja bem, o lucro destas máquinas vinha dessas fichas, então jogos difíceis davam mais dinheiro. Nesse caso, a vida dos personagens dos arcades era bem efêmera, e se acabasse logo melhor, pois seria a garantia de que mais uma ficha seria gasta.

Quando foram dos arcades para os games, as vidas continuaram sendo aquele recurso dos produtores para aumentar a longevidade. Um jogo mais difícil, e com vidas mais esparsas, era sinônimo de um game duradouro. Mas, deixando um pouco a parte da jogabilidade, alguém reparou que as vidas não representam NADA na história do jogo? Se o Mario por acidente é atingido por uma bola de fogo do Bowser, ele morre e volta para o último checkpoint. Mas qual é a explicação para esta ressurreição do encanador? Os outros personagens sabem que ele faleceu? Ou quando ele morreu se abriu um portal que o enviou para o passado? Essas perguntas não têm respostas, o que entrega que as vidas são um recurso apenas para a jogabilidade.

E se tirarmos as vidas?

O Mario continua como o exemplo mais clássico da utilização de vidas, e vamos escolher Super Mario World (SNES) como exemplo, tudo bem? Mario se trata de um jogo de plataforma focado em cálculo de saltos. Dessa forma, você precisa saltar em plataformas e fazer uma conta mentalmente para garantir que Mario pouse na plataforma desejada sem qualquer problema. Para garantir a dificuldade neste jogo, um desafio tem que ser colocado para impedir o salto, como um Parakoopa ou um Bullet Bill. E tocando nestes inimigos com o Mario pequeno, ou se cair em um buraco, é morte certa.

As vidas em Super Mario World estão distribuídas uniformemente pelas fases, seja em blocos ou na forma de moedas (somente quando muitas são acumuladas), e não se tem muita dificuldade em encontrá-las. Observando esses fatos, a gente pode imaginar que a intenção dos produtores do jogo era de oferecer um game de plataforma de dificuldade moderada, sem que fosse frustrante. Várias ocasiões estão lá para “presentear” o jogador com vidas extras, então sempre há uma chance de avançar.

Do lado oposto a este estilo de jogabilidade vejo Super Mario World 2, ou Yoshi’s Island para os mais íntimos. Ao contrário do antecessor (que de antecessor tem apenas o nome, pois os jogos são diferentes como água e vinho), este jogo não possui contador de vidas. Indo mais longe, não há nem uma barra de energia para “matar” o Yoshi! Não quer dizer que você não vai morrer se cair naquele buraco em um pulo mal-calculado, mas na teoria este jogo deveria ser mais fácil por conta da ausência das vidas. Será?

Dessa vez, o jogo é mais focado em exploração ao invés dos pulos. As fases estão melhores construídas, com segredos ocultos nos belíssimos cenários e diversos itens que devem ser coletados para garantir a pontuação máxima ao fim da fase. E embora não haja um contador de vidas necessariamente falando, sua tentativa naquela fase se encerra quando contador do Baby Mario se esgota naqueles momentos que o pirralho sai voando das costas do Yoshi. Assim, não existe vida em Yoshi’s Island porque ela não se faz necessária. A intenção do diretor do jogo foi de criar algo ligado à exploração, não aos pulos.

Exploração vs Saltando por aí

Até o momento a teoria é de que os jogos com vida são dedicados aos desafios com plataformas e os sem vida são os destinados à exploração, correto? Dá pra encontrar outros exemplos desse tipo. Ainda no universo do Mario, mas na fase de ouro do Game Boy, a Nintendo tornou Wario o protagonista do terceiro jogo da série Super Mario Land. Desta vez toda baseada no acúmulo de dinheiro, alguns jogos do agora nomeado Wario Land não possuem contador de vida para que o jogador se sinta convidado a explorar aquele mundo.

E que tal lembrar daquele outro jogo e plataforma em 3D lançado no Nintendo 64, o maravilhoso Banjo-Kazooie? No primeiro jogo, havia (horrorosas) estátuas de ouro no formato do urso que valiam uma vida extra, além de uma dor de cabeça porque sempre estavam localizadas em locais impossíveis. E, de fato, o primeiro Banjo-Kazooie era um autêntico jogo de plataforma que você morria diversas vezes e, consequentemente, perdia o progresso feito.

Quando a continuação, Banjo-Tooie, foi lançada, a primeira coisa que víamos, depois dos cenários obscenos de tão gigantescos, era a ausência do contador de vida. Se você perdesse toda a sua energia, o jogo te botava de novo na fase sem cobrar nada em troca. E você ainda mantinha as notas musicais coletadas, olha que prático. E por que isso? Porque agora o foco era a exploração, era visitar os mesmos lugares repetidas vezes até encontrar tudo o que havia escondido. A série continuou esta linha crescente de não se importar com as vidas, tanto que em Banjo-Kazooie Nuts & Bolts, do Xbox 360, quando a barra de energia do Banjo chega ao fim logo aparece a Kazooie de dentro da mochila e o acorda na base da porrada. Viu só? É a desvalorização completa da vida nos games, porque uma contagem de vidas atrapalharia a intenção original dos jogos.

E atualmente?

Atualmente vemos os jogos um pouco mais soltos, e os produtores andam ousando mais na questão da vida para atingir seus objetivos. Kirby Epic Yarn (Wii) é um jogo para crianças, fato, e portanto não pode ter uma dificuldade elevada. Neste jogo a coisa é tão facilitada que é impossível morrer. Enquanto jogava este game de belos gráficos e de diversão nem tão bela assim, uma hora notei que não havia morrido. Como queria ver a tela de Game Over, me joguei no primeiro buraco que vi... e uma mão me resgatou e me colocou de novo na plataforma. Praticamente não dá para morrer em Kirby Epic Yarn, e isso acontece porque o jogo foi destinado aos mais novos.

Ainda nos jogos de plataforma, dois exemplos fantásticos desta geração são Donkey Kong Country Returns e Rayman Origins, ambos de Wii. Ambos compartilham a renovação de suas franquias com as características de suas estreias com uma dificuldade elevadíssima. E em ambos, as vidas abundam. No novo jogo do macacão, ainda se precisa pegar os balões com vidas, mas eles são tão comuns que dificilmente você se pegará em um momento crítico de racionamento de vidas. E em Rayman Origins, então, que nem contador de vida tem? Se você morrer, após a animação da explosão do seu personagem já entra de novo ele vivinho da silva no último checkpoint. Para quê o jogo vai fazer o jogador sair caçando vidas se a vontade do criador é que o jogador explore o mundo sem se frustrar com a dificuldade elevada? Neste ponto, um bom uso das vidas.

Toda essa análise da vida nos games serve para mostrar apenas uma coisa: embora elas não acrescentem nada à história dos games, a maneira como é disposta nos mesmos revela a intenção do criador daquela aventura. Não há por que colocar um contador de vidas quando o foco é exploração, mas também é possível ignorar essa “ditadura de energia” mesmo se você quiser produzir um jogo de plataforma tradicional (como Rayman Origins). Você consegue lembrar algum outro exemplo dos jogos? Compartilhe conosco nos comentários!

Revisão: Leandro Freire
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