Novembro finalmente chegou, hora de novo Zelda, novo Mario, Batman, Uncharted, Elder Scrolls, Assassin's Creed... mas será que é só de grandes franquias internacionais que os jogos são feitos? E se olhássemos para mais perto, será que não encontraríamos novidades sendo produzidas aqui mesmo, no Brasil? A boa notícia é que sim, e o resultado dessa busca você confere abaixo.Para essa matéria foram considerados apenas jogos sendo desenvolvidos no Brasil, ainda não lançados.
O folclore em evidência
As universidades brasileiras já se provaram uma das maiores forças na produção e incentivo de jogos no país, com diversos projetos de games educativos, seja recriando o ambiente da Revolução Francesa em Tríade (Universidade do Estado da Bahia), A Revolta da Cabanagem (Universidade Federal do Pará), ou brincando com partículas subatômicas em Sprace (Unesp), entre vários outros temas. Claro, são jogos mais simples, de produção mais barata, gráficos nem tão bons, etc., mas não podemos esquecer que o objetivo é a educação e não o lucro - tanto que a maioria desses jogos são gratuitos - e que criar um jogo atualmente demanda muitos recursos.
Por esses motivos que ver as universidades brasileiras investindo nessa mídia sempre é gratificante. E o próximo projeto vem diretamente da Universidade Federal de Pernambuco, da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Campina Grande e do Curso Superior de Jogos Digitais da Facisa: Xilo. Sendo desenvolvido pelo Professor Rodrigo Motta e seus alunos Diego Galiza, José Trigueiro e André Torres, o jogo de plataforma 2D clássica tem sua inspiração nos famosos cordéis e xilogravuras do nordeste brasileiro, adotando o mesmo belo estilo artístico.
A história é baseada em figuras populares do nosso folclore, tais como o Saci, o Curupira, a Mula-sem-Cabeça e o Boitatá. O herói é o nordestino Biliu, que parte em uma jornada pelos sertões para salvar sua família de uma doença, coletando xilogravuras mágicas e enfrentando as criaturas mencionadas.
Xilo está sendo desenvolvido para Windows e MacOS, e caso consigam o apoio necessário, também poderá aparecer no iPad, iPhone/iPod e na Xbox Live. Ainda sem data de lançamento confirmada.
Infiltrando-se num palácio das maravilhas na Síria
Fora das universidades (e do reino dos advertgames, jogos feitos com fins publicitários para alguma marca), o cenário mais fecundo para os desenvolvedores brasileiros é a cena indie, que nos últimos anos teve um boom de crescimento e popularidade. Para quem não sabe, jogos indie (de independente), são aqueles feitos geralmente por pequenas equipes e sem o suporte de grandes produtoras, visando normalmente a distribuição online, em especial os PCs e, mais recentemente, as lojas virtuais dos consoles.
Nesse segmento que está a produtora curitibana Aduge Studio, responsável por Qasir Al-Wasat. A premissa você já conhece, infiltrar-se em um palácio e executar a sua missão, nos mesmos moldes de outros jogos de stealth (furtividade), que teve talvez como último representante a série Assassin's Creed. Como é tradicional a esse gênero, seu objetivo é invadir uma construção, no caso um palácio das maravilhas na Síria do século XII, e assassinar seus três alvos antes do amanhecer, sem ser notado.
Mas não pense que estamos diante de algo genérico, Qasir Al-Wasat tem como trunfo a ideia original de transformar um conceito fundamental do stealth: seu personagem é invisível, o que transforma o “não ser visto” em “não ser notado”. Enquanto percorre as salas 2D de tradicional estilo árabe, sua preocupação será não produzir barulhos, mexer em objetos e evitar eventuais substâncias que poderiam grudar no corpo, revelando sua posição. Para o personagem morrer, basta um único golpe, então a discrição deverá ser total.
Segundo Bruno Bulhões, o diretor criativo da Aduge Studio, o ponto mais importante na estética do jogo é o conceito de gambito, o gerenciamento de riscos e recompensas. Os desafios do game terão uma solução mais fácil, mas pouco compensadora, e outra de alto risco, mas com compensação bem maior.
Com lançamento planejado para o verão de 2012 no Windows e logo em seguida no Mac OS, Qasir Al-Wasat está recebendo doações no PayPal, algo muito comum entre as produções independentes. E se você gostou do que viu, fique sabendo que uma sequência já está nos planos do estúdio, Tsar Project, mantendo a mesma proposta de seu antecessor, com inteligência artificial avançada e se passando na Rússia do século XVI.
Da escuridão para a luz
“Foram eras de ódio... Eras de preconceito... Eras de guerras...Em um mundo dividido, corrompido e decadente,entrávamos numa nova era...A era da luz e da escuridão...”- do site oficial
A Luz da Escuridão é um dos jogos brasileiros mais comentados nos últimos tempos, devido à recente campanha para arrecadar recursos para o seu lançamento. Embora a Epifânica, estúdio responsável pelo game, tenha conseguido atrair uma atenção inicial para o projeto, não estava fácil conseguir os 22 mil dólares necessários para avançar com os planos.
Decidiram apostar então na comunidade gamer, e colocaram o jogo no site Kickstarter, onde você divulga um projeto, a quantidade de dinheiro que você precisa para realizá-lo, e os interessados fazem doações. Se o valor for alcançado antes do término do prazo, você está financiado, se não, todo o dinheiro é devolvido. Poucos dias antes do final do prazo para A Luz da Escuridão, ainda faltava boa parte do montante necessário. Foi então que uma pequena mobilização surgiu para salvar o game e, em 12 de setembro de 2011, quando se encerrava as doações, 22.264 dólares haviam sido arrecadados.
Como incentivo, vários brindes interessantes foram prometidos para quem ajudasse a dar vida ao game. Todos que contribuíssem com mais de US$5, por exemplo, receberiam uma cópia do jogo no seu lançamento. Alguns mais legais incluíam aparecer como estátua ou ter seu nome em uma lápide nos cenários. Os primeiros prêmios, como artes conceituais e wallpapers, já começaram a ser entregues; então, se você participou fique atento. Fernando Rabello, criador do jogo, já disse que com esse capital conseguirão terminar a versão para PC e a paralela para iOS, mas ainda são aceitas doações via PayPal.
Mas que jogo é esse que atraiu tanta gente? A lista de inspiração, Castlevania, Muramasa, Odin Sphere, Demons Chest e Actraiser, já nos fornece uma boa pista. Trata-se de um sidescroller 2D que mistura RPG, ação e plataforma, com ênfase na arte e no visual e apelo retrô. A exploração terá grande destaque, não sendo este um jogo de progressão linear, mas sim exigindo percorrer um vasto mundo, sendo necessário retornar para alguns pontos em diferentes momentos. As habilidades do personagem, que envolvem voar, planar e realizar feitiços, são importantes para o avanço pelo cenário e para a resolução de puzzles, além de evoluírem ao longo da jornada.
Segundo o criador do jogo, o objetivo é construir um universo inteiro, inclusive com um idioma próprio criado do zero, o Sansico, que ainda conta com quatro dialetos e alfabeto, além de raças diferentes e toda uma nova mitologia. Como o nome indica, esse é um jogo que brinca com a dialética, explorando os conceitos de escuridão e luz e relações conflitantes. A história principal gira em torno de Sephius, primeiro híbrido de uma criatura da luz e outra da escuridão.
Mais detalhes sobre o universo e o desenvolvimento deste projeto podem ser encontrados no site oficial e no blog. Abrindo um parênteses, cabe aqui um elogio ao esforço da Epifânica de manter todo esse conteúdo, tanto no site quanto no blog e no Kickstarter, em português e inglês, o que considero essencial para a popularidade do jogo. Fazer um diário de desenvolvimento também é uma ótima ideia para manter o público interessado e atualizado.
Como já foi dito, A Luz da Escuridão (The Light of the Darkness, título em inglês) está sendo desenvolvido para PCs e iPhone. Embora concorde que esse é um game para consoles, Fernando Rabello admite que por enquanto não há a possibilidade de versões para plataformas de mesa. Lançamento provável em algum ponto de 2012.
O jogo indie 3D que chamou a atenção do mundo
Uma grande torre envolve a vida da pequena princesa
Um contrato, um caminho e o próprio Tempo...
...ela está prestes a enfrentar
Uma jornada a qual nos submetemos, buscando nossas verdades
Ultrapassando os obstáculos em busca daquilo que nos completa
Uma espada, uma arma, uma porta, uma resposta
Uma razão de existir em meio às pedras frias
- do site oficial
Toren, guardem esse nome. O único jogo em 3D da nossa lista começou como um projeto de pós-graduação de três gaúchos, Alecssandro Martinello, Conrado Testa e Luiz Alvarez, e em pouco mais de sete meses, foi responsável pela criação do estúdio Swordtales. Finalista na Brasil Game Show na categoria Arte e Design, competiu com grandes produções, e ganhou o mundo quando foi destaque no IndieGames.com, um dos maiores sites dedicados aos jogos indie do planeta.
O que pode ter chamado tanta atenção num jogo que tem tão poucos detalhes divulgados e só recentemente teve seu primeiro trailer? Talvez sejam os belos gráficos, de qualidade acima da média de outros games indie. Talvez seja o estilo artístico, original e muito bonito. Talvez a proposta diferente. Ou talvez tudo isso junto.
A história começa com uma garotinha acordando numa misteriosa torre, logo tomada por uma grande árvore. Podemos esperar por vários puzzles que envolvem mecanismos como botões e alavancas, além de momentos de ação. Também foi mostrada uma luneta que serve para encontrar escritos na areia.
Não demorou para que surgissem comparações com The Legend of Zelda, ICO, Shadow of Colossus, Braid, os filmes do Hayao Miyazaki, entre outros. O importante não é ser comparado a essas obras aclamadas, mas sim o fato de que, se tantas pessoas viram tantos trabalhos diferentes, mas igualmente excelentes, nesse único jogo, algo ele tem de especial.
Segundo os criadores, Toren é um jogo sobre a garota presa numa torre. Não sobre o herói que vai salvá-la, mas sobre a garota mesmo. Também é um jogo sobre amadurecimento: nossa personagem precisa escalar a torre, e isso provoca transformações na menina e em todo o ambiente que a cerca. A transformação do cenário deverá ser um dos destaques.
Assim como disse acima para a Epifânica, o pessoal da Swordtales está de parabéns pelo site e pelo blog de desenvolvimento, ambos em português e em inglês e com conteúdo muito interessante, ainda mais se alguém pensa em criar seu próprio jogo algum dia.
Ainda sem previsão de lançamento, Toren está sendo feito para PC e Mac OS, e apoio está sendo buscado para versões nas lojas virtuais dos consoles de mesa.
Esses jogos estão aí para provar não só que é possível desenvolver conteúdo de qualidade e diferenciado no Brasil, mas que isso já vem sido feito. A nós, jogadores, cabe deixar um pouco o preconceito e a ignorância de lado e, achando algum desses projetos merecedor, dar nosso suporte e reconhecimento para que mais ideias ganhem vida no futuro.
Revisão: Jaime Ninice