Imagine que em 1997 o que mais se ouvia falar nas ruas era o sucesso de Titanic – mais um dos inúmeros do diretor James Cameron e que contava a trágica e curtíssima história do mais luxuoso navio transatlântico de sua época. Poucos anos depois, no final dos anos 1990 e início dos anos 2000 surgiram mais um punhado de filmes que abordavam naufrágios, como o filme Poseidon, Navio Fantasma, dentre outros.
Em Hollywood é indiscutível o sucesso que esse tipo de filme faz – e isso não é de agora, já vem desde o início da indústria cinematográfica –, porém nos vídeo games tal fórmula não consegue o mesmo efeito. Jogos que abordam o tema (naufrágio) tem, antes mesmo da sua concepção, o desafio de “como ser interessante?”, ou melhor: “como não ser chato e sonolento?”.
S.O.S, lançado em 1994 pela Human Entertainment (conhecida pela série Clock Tower) para o SNES, é um daqueles jogos que passaram despercebidos nos consoles dos gamers e passam despercebidos nas listas de ROMs de qualquer fã de emulação, mas não por ser um jogo ruim.
Todo o jogo foi baseado no livro The Poseidon Adventure (1969) de Paul Gallico e no filme homônimo vencedor do Oscar de melhores efeitos especiais e melhor canção original de 1973. Na telinha, você está viajando no luxuoso transatlântico Lady Crithania e assumirá o papel de um dos 4 personagens disponíveis: o arquiteto Capris Wisher; o advogado Redwin Gardener; o médico Jeffrey Howell ou o marujo e membro da tripulação Luke Haines.
O acontecimento é um só: o luxuoso navio passa por uma terrível tempestade e, atingido por uma onda gigantesca, começa a naufragar. O objetivo também é um só: tentar escapar o quanto antes, pois em 1 hora o navio estará completamente submersso. Essa história pode parecer manjada para quem já assistiu a todos esses filmes que citamos, porém uma das coisas que torna S.O.S um jogo interessante é que cada personagem tem sua história, suas motivações e habilidades especiais, alcançando seus objetivos de maneiras distintas.
Além do desafio de escapar de um navio que está naufragando, ainda há os desafios de resgatar sobreviventes e do tempo. Sim, você poderá conduzir sobreviventes retardados e suicidas rumo à salvação nos míseros 60 minutos que há de jogatina antes do navio explodir e ir para o fundo do mar. O mais interessante aqui é que, após ser atingido pela onda, o navio vira de ponta cabeça e fica ocilando como um pêndulo, tornando a sua movimentação e dos sobreviventes mais difícil e perigosa. Caso o jogador caia de uma altura muito grande, seja atingido por um objeto ou caia no fogo, é penalizado com a subtração de 5 minutos dos 60 totais que tem para escapar. Não há morte aqui, não até o tempo se esgotar.
S.O.S é um adventure side-scrolling atípico cujos adversários do personagem são o cenário, os próprios sobreviventes e os controles. Sim, os controles não ajudam muito. Na realidade quando se joga S.O.S pela primeira vez, tem-se que ter em mente que as suas duas primeiras tentativas de jogar serão voltadas para aprender os controles do jogo (já que não existe uma tela de Options para vê-los) e para se acostumar com o cenário que é um verdadeiro labirinto tamanha a grandiosidade do navio.
Uma vez superados esses problemas, o desafio é conseguir escapar do navio com a maior quantidade possível de sobreviventes. Apesar disso não ser algo obrigatório, o final do jogo depende da quantidade de sobreviventes resgatados por você – e existe toda uma matemática por detrás disso, já que há tipos de sobreviventes e cada um deles vale uma pontuação específica. O fato é que há 4 finais possíveis para o jogo – um ruim, um menos ruim, um mais ou menos e outro feliz, se assim se pode dizer.
A primeira vez que joguei S.O.S eu simplesmente não consegui jogá-lo. Achei-o de uma complexidade incrível e a única coisa que realmente me atraiu nele foram as cutscenes do navio sendo atacado pela onda gigantesca e da sua explosão seguida do naufrágio. Foi isso. Mas também eu tinha meus 10 anos mais ou menos e não poderia esperar mais.
Há alguns dias voltei a jogá-lo e finalmente percebi sua grandiosidade – os gráficos são modestos, é verdade, mas repletos de detalhes que ajudarão (e atrapalharão) a exploração do mapa. Para a época, os personagens até que tem seu glamour – cada um deles com vestimentas distintas, habilidades singulares e histórias que os influenciarão durante todo o jogo. Os efeitos sonoros não são dos melhores, mas dão para o gasto. A jogabilidade é difícil a primeira vista – a curva de aprendizagem dos controles e da exploração do cenário é rápida, porém exige paciência –, mas torna-se fácil após a primeira hora de jogo.
O grande trunfo de S.O.S é justamente como a Vic Tokai, desenvolvedora do jogo, tratou as perguntas do começo desse texto – como um jogo de naufrágio de navio não ser tão chato e sonolento e sim interessante?
Sem invencionices de monstros, passageiros-zumbis ou coisas do tipo, a equipe responsável pelo jogo percebeu que, tal qual na situação real, o maior impencilho para sobreviver a um desastre como esse é o próprio navio e o tempo – e assim foi feito S.O.S. Um jogo que exige de nós, passageiros, ação e raciocínio rápido em busca da sobrevivência. Haverão momentos de frustração sim, mas pelas tentativas de escapar do gigante que afunda, o passageiro acaba por conhecer o navio, literalmente, de baixo pra cima.