Por que não há timeline coerente em Zelda

em 23/07/2009

Heróis sintetizam um legado à ser preservado. A contemplação do passado é um aspecto comum em todas as culturas, reverenciar a história acre... (por Felipe Teobaldo em 23/07/2009, via Nintendo Blast)



Heróis sintetizam um legado à ser preservado. A contemplação do passado é um aspecto comum em todas as culturas, reverenciar a história acrescendo-a de metáforas e feitos fantásticos que ilustrem valores é um exercício criativo de toda sociedade. É nesse processo lento de desapego autoral da fantasia e da midiatização popular que nasce o folclore, e aí, lendas.

E o que seriam dos jogos sem mitologia? Parece que toda nossa tecnologia tem sido utilizada na tentativa de recriar virtualmente esse mundo imaginário de centenas de anos, do ocidente (de God of War e a mitologia grega clássica) ao oriente (de Okami e sua Amaterasu)

A sabedoria de milênios sobrevive pela força do arquétipo e do inconsciente coletivo - segundo Carl G. Jung, estamos unidos por impressionantementes constantes nas mais variadas culturas, em personalidade e em manifestações criativas, por todo o mundo.
In a realm beyond sight, the sky shines gold, not blue...
There, the Triforce's might makes mortal dreams come true.
- The Book of Mudora
O simplismo do roteiro de The Legend of Zelda representa uma dessas constantes. Os conceitos de Poder, Coragem e Sabedoria transcendem qualquer barreira cultural, elas dizem respeito ao interior dos valores da sociedade humana.

Diferentemente de outros jogos, com narrativas intrínsecas, TLoZ não constrói relações longas entre seus jogos. A inconstância do protagonista é um outro ponto consistente. Link já foi uma criança, adolescente e adulto. Link não é loiro, não é ruivo, nem tem cabelo castanho.

O jogo de cintura da Nintendo para manter vivo o arquétipo, acima da imagem de quem é esse herói é admirável. Shigeru Miyamoto - Game Designer de TLoZ fez questão de quebrar o padrão visual de todas suas investidas - depois de Ocarina of Time e Majora's Mask para o N64, (jogos considerados um marco na história dos videogames) fomos supreendidos por um herói cartunesco e atrapalhado no GameCube, que em nada lembrava a fórmula de sucesso anterior.

Ocarina of Time vendeu 2.5 milhões de cópias em 1998, recebeu a nota 10-10 da Famitsu, entrando pra um hall exclusivo de jogos aclamados pela crítica e público. Por que então mexer num sucesso absoluto?

O real herói da série é a encarnação do valor Coragem - ou "o menino vestido de verde". E nessa estrutura única, Link nada em possibilidades. Todo jogo esta livre para adaptar o arquétipo, onde e quando for mais interessante reincarna-lo.

É possível encontrar com certa frequência artigos tentanto criar timelines, e colocar horizontalmente os jogos de Zelda, numa ordem lógica de roteiros. A Nintendo no entanto já confirmou que nenhum jogo tem necessariamente ligação com outro. Essa informação parece irritar os fãs, que querem extrair da conexão de todos os jogos uma mitologia maior.

A reimaginação do conto a cada geração, enche de nova energia e ritmo o que já conhecemos. É como visitar um lugar que moramos anteriormente e usar desse conhecimento para melhor aproveitar o tempo em nossa nova estadia, um revisionismo tão comum em moda, culinária e literatura.

A Lenda de Zelda tem 22 anos, e é material vivo na cabeça dos jogadores e game designers. Acompanhar a evolução da lenda, é fazer parte dela. Uma pena que alguns fãs não percebam que a história do menino que luta contra o poder para salvar sua princesa não é um conto hylian, mas uma crônica humana, sobre como podemos ser extraordinários sem restrições de tempo e espaço.

Urban Pop-Culture Enthusiast.
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