No Nintendo Direct do dia 3 de março de 2016, a Nintendo anunciou Paper Mario: Color Splash (Wii U), um novo jogo numa das mais amadas séries spin-off do bigodudo. Bem, pelo menos era uma das mais amadas. Muitos amigos meus ficaram imediatamente decepcionados pois, aparentemente, Color Splash segue o caminho iniciado por seu antecessor no Nintendo 3DS.
Quando foi lançado em 2011, Paper Mario: Sticker Star (3DS) foi muito criticado por abandonar muitas das mecânicas de RPG, herança direta de Super Mario RPG: Legend of the Seven Stars (SNES), que deram fama à série no Nintendo 64 e no GameCube. Essas mecânicas já haviam sido muito amenizadas em Super Paper Mario (Wii), mas o jogo do Wii ainda era uma combinação dos gêneros RPG e 2D sidescroller. Em Sticker Star, não havia mais pontos de experiência para tornar o Mario mais forte. A progressão do jogo era ditada por adesivos (stickers) coletados durante a jogatina, que podiam ser usados para atacar ou resolver puzzles.
Contudo, Sticker Star não é um jogo ruim. Apesar da recepção menos calorosa que a de seus antecessores, ainda foi avaliado como um jogo acima da média por boa parte da crítica. Por que, então, deixou um gosto tão amargo nas bocas dos fãs da série? A resposta é simples: ao ver "Paper Mario" no título, um comprador familiarizado com os jogos antigos tinha uma expectativa muito clara do que seria aquele jogo, mas, para sua surpresa, o que recebeu foi um jogo muito similar em estética, mas muito diferente em mecânica e narrativa.
Eu não vou julgar a desenvolvedora, Intelligent Systems, por querer fazer algo diferente. Após fazer dois jogos no mesmo estilo e ter obtido muito sucesso misturando esse estilo com Mario tradicional, é natural que queiram mudar um pouco a fórmula. Afinal, é um estúdio conhecido por sua versatilidade de gêneros. Também é natural que quisessem continuar usando o nome Paper Mario, pois sua fama facilitaria as vendas do jogo.
Entretanto, pode ser que essa decisão seja um tiro no pé. Após serem decepcionados por Sticker Star, muitos fãs sequer considerarão jogar Color Splash. A imagem da série foi sujada. Então, fica outra pergunta: esses dois jogos, já que mecanicamente tão distintos dos anteriores, precisavam ser associados ao nome Paper Mario?
Uma crítica recebida por Sticker Star e precipitadamente dada a Color Splash é a falta de variedade nos NPCs; enquanto os primeiros jogos da série tinham uma variedade imensa de Toads, os últimos mantiveram quase exclusivamente o Toad comum: branco com bolas vermelhas. Confira este pedaço do Iwata Asks sobre o design de personagens em Paper Mario: Sticker Star, publicado perto do lançamento do jogo:
Nesse trecho, o produtor Kensuke Tanabe e o diretor Taro Kudo explicam a motivação pela simplificação dos designs dos personagens. Segundo eles, a mudança aconteceu quando Shigeru Miyamoto (que é, ainda, o responsável criativo pelo universo de Super Mario) finalmente conseguir expressar em palavras os padrões de design para personagens de Mario durante o desenvolvimento de Super Mario Galaxy (Wii).
Antes disso, equipes trabalhando em spin-offs não poderiam criar espécies novas para o universo. Essa limitação, contudo, trouxe ao primeiro Paper Mario um de seus aspectos mais charmosos: ainda temos só Toads, Goombas, Koopas e outras espécies reconhecíveis, mas dentro de cada delas há uma grande variedade. Inclusive, pela primeira vez, tínhamos exemplos de algumas criaturas, que normalmente serviam apenas como inimigos, servindo como aliados ao encanador.
Pelo que Tanabe e Kudo descrevem, a maior clareza no processo mental de Miyamoto, no qual o design de um personagem é estritamente funcional, acabou restringindo mais ainda o processo criativo da série. E, assim, lá se foram a Toad chef, o Toad mago, o Koopa explorador e o Goomba professor.
Talvez para um jogo portátil como Sticker Star há sentido em fazer uma história mais simples e dividida. O que entristeceu fãs foi que essas decisões de design seguiram para Color Splash num console de mesa. Então, dadas as mudanças de gameplay oriundas do abandono de mecânicas de RPG e as mudanças narrativas oriundas da simplificação no design de personagens, é de se perguntar por que insistiram que esses jogos fossem parte de uma mesma série.
Uma possível solução seria brincar com a ideia de papel em outros contextos. Talvez Paper Kirby ou Paper Yoshi (dois personagens que funcionaram muito bem feitos de lã) seriam mais amigáveis à mecânica de adesivos e aos personagens simples. Ou até fosse o caso de criar uma série diferente, o santo graal da indústria de jogos, o famigerado "New IP".
Shigeru Miyamoto e outros game designers da Nintendo já falaram que não é raro eles primeiro bolarem uma mecânica de jogo e depois encontrarem uma série da empresa que combine com isso. Jogos (não necessariamente principais) das séries Mario, Zelda e Kirby já foram desenvolvidos assim. É de se supor que Splatoon (Wii U) poderia, em um universo paralelo, ter sido nada mais que "Super Mario Paintball", mas foi decidido que as mecânicas criadas seriam aplicadas numa série independente. Uma jogada arriscada que acabou sendo muito recompensadora.
Talvez o sucesso de Splatoon ensine essa lição à Nintendo: normalmente é melhor surpreender positivamente pessoas com uma série nova cheia de mecânicas interessantes do que decepcioná-las com um jogo diferente numa série já amada. Mas, infelizmente, Color Splash não foi o primeiro e nem será o último jogo que sofre por ser o patinho feio da sua série. Metroid Prime: Federation Force (3DS), também do produtor Kensuke Tanabe, está numa situação muito similar, com uma reação muito negativa de pessoas dizendo "não é isso que quero de Metroid", apesar de muitos concordarem que o jogo pode ser bom e divertido se desconsideradas as expectativas que um nome conhecido no título carrega.
Revisão: Robson Júnior