N64

#Zelda30th: Ocarina of Time (N64) e as 1001 formas de conseguir a Triforce

Relíquia dominou os sonhos (ou pesadelos) dos fãs da série durante vários anos.

em 05/02/2016

Sendo uma história com mitologia tão rica e cheia de elementos próprios, a lenda de Zelda dificilmente ficaria restrita ao mundo dos videogames. Ao longo dos últimos 30 anos, referências à princesa de Hyrule e seu herói de gorro verde já foram encontradas em filmes, seriados, desenhos animados e até mesmo em jogos que não tem nenhuma relação com a Nintendo, como Borderlands 2 (Multi) e InFAMOUS: Second Son (PS4). Não restam dúvidas de que Link e companhia são figuras carimbadas da cultura pop mundial. E, talvez, o maior exemplo de que a franquia extrapolou as fronteiras dos consoles e cartuchos tenha acontecido no final dos anos 1990, quando um “vírus” chamado Triforce ganhou força com o lançamento de Ocarina of Time (N64) e infectou toda a internet.


A busca pela relíquia sagrada pode ser considerada a maior fábula de todos os tempos já criada em torno de um jogo. Entre 1998 e 1999, os populares fóruns e os sites especializados na série só tinham um assunto: como conseguir pegar a Triforce em Ocarina of Time. Teorias e mais teorias surgiam todos os dias, explicando o que fazer para se tornar o portador dos triângulos dourados e como essa conquista resultaria em uma mudança total no enredo da aventura. Os jogadores, inclusive esse que vos escreve, dividiam seu tempo entre pesquisas na internet para encontrar novos e mirabolantes métodos de adquirir o desejado objeto e as decepções de testá-los e perceber que não passavam de boatos e rumores.

A obsessão em torno do tesouro era tamanha que até a própria Nintendo entrou na onda e há quem diga que o próprio Shigeru Miyamoto chegou a escrever um poema sobre o assunto. Hoje, vamos devolver a Master Sword ao seu pedestal no Temple of Time para voltar alguns anos no passado e reviver o período em que todo fã de Zelda não tinha outro pensamento a não ser a Triforce.

A origem de tudo

E se eu começasse dizendo que, sim, realmente é possível pegar a Triforce em Ocarina of Time? Certamente, muitos iriam me chamar de louco e parar a leitura por aqui, porém isso não deixa de ser verdade, pelo menos, na versão beta do jogo. Existe muito material que mostra detalhes da fase de desenvolvimento da primeira aventura tridimensional de Link e, entre esses arquivos, há um gif com pequena animação do herói do tempo abrindo um baú e tirando o valioso artefato lá de dentro. No início, a ideia da equipe de criação realmente era ter a Triforce como item coletável, porém o molde final da história fez essa possibilidade ser logo descartada para não causar furos no roteiro.

O gif da discórdia
Apesar de ser somente um dos diversos registros da beta, o gif se espalhou como se fosse algo presente na versão final, fazendo com que alguns jogadores começassem a vasculhar cada centímetro de Hyrule em busca da misteriosa sala azul que continha o baú. Apesar de ter mexido com o imaginário de alguns, muitos outros fãs não deram bola para o assunto e nem levaram a caçada a sério, até surgir alguém dizendo que conseguiu encontrar a Triforce e divulgando fotos de seu glorioso feito.

Ariana, a colombiana que “achou” a Triforce

O caso Ariana foi a faísca que faltava para a questão Triforce explodir e viralizar por toda a internet. No início de 1999, uma jovem colombiana enviou um e-mail para o site Land of Zelda dizendo que havia encontrado a sagrada relíquia e dava algumas dicas de como achá-la. Segundo a garota, o objeto deveria ser localizado antes de Link colocar as mãos na Master Sword, afinal, depois disso o artefato é dividido em três partes. A história de Ariana dizia que era preciso encontrar outra maneira de entrar no Sacred Realm que não fosse passando pelo Temple of Time. No início, ela não conseguiu convencer quase ninguém. Mas para provar que estava falando a verdade, a menina enviou um nova mensagem para o portal com três fotos que, teoricamente, comprovavam sua versão.
Finalmente, a Triforce! #sqn
As imagens mostram Link aprendendo com Kaepora Gaebora a música Overture of Sages, depois, o garoto entrando no Temple of Light e, por último, o herói olhando para os triângulos dourados. Como naquela época programas de edição de imagem não eram tão populares como atualmente, as fotos foram tratadas como verdadeiras, causando um tremendo alvoroço. A colombiana não ficou satisfeita e queria ainda mais fama, ela mandou um terceiro e-mail para o Land of Zelda explicando os detalhes de sua descoberta. Segundo a menina, era preciso encontrar a coruja Kaepora Gaebora em algum lugar de Hyrule para aprender a canção, é claro que a garota não explicou exatamente onde. Depois, seria preciso tocar a melodia em frente ao pedestal da Master Sword e ser transportado para o Temple of Light.
Aprendendo a Overture of Sages
No final da dungeon, Link encontraria Rauru que mostraria ao herói o objeto dourado. Quando o garoto tenta tocá-lo, o sábio informa que ainda não é o momento apropriado e o envia de volta ao Temple of Time, fazendo o jogo prosseguir normalmente. Após muitos meses de caça à coruja, obviamente ninguém conseguiu encontrá-la. As famosas fotos foram analisadas por profissionais que constataram se tratar de uma fraude. Quanto a Ariana? Ninguém nunca mais ouviu falar dela e há quem diga que ela nunca existiu e tudo não teria passado de uma invenção do Land of Zelda para se promover.
Como suspeitar dessa imagem em 1999?

Miyamoto entra na história

A histeria se generalizou após o caso Ariana. Os boatos em torno da presença da inestimada peça em Ocarina of Time se multiplicavam a cada dia e ganharam ainda mais força quando, supostamente, Miyamoto resolveu falar sobre o assunto. O produtor teria concedido entrevista na qual dizia que: “é muito fácil pegar a Triforce, como ainda não descobriram? Quando vocês descobrirem como pegá-la, vão bater a cabeça na parede de tanta raiva, pois é muito fácil". Junto dessa declaração, começou a circular a notícia de que a Nintendo estaria oferecendo 40 mil dólares como recompensa para quem desvendasse o mistério.

Esse foi o combustível que faltava para quem ainda não acreditava nos rumores e, a partir de então, o número de jogadores que procuravam os triângulos só aumentava. Como ninguém conseguia avançar nessa jornada, Miyamoto teria voltado à cena, alguns meses depois, escrevendo um poema que serviria como dica na aventura:
"Se você procura abrir o portão
A chave que busca é um destino sombrio.
Nos segredos que se encontram abaixo do solo.
É onde a sabedoria desejada é encontrada.
Para achar a terceira força do poder,
Primeiro você deve encontrar a flor sagrada.
Quando as três estiverem reunidas em um só lugar.
Então você verá a face sagrada.
No reino depois do portão que você passar.
Diante de você aparecerá uma celebração magnífica.
Três estruturas de pedra com nomes familiares a você.
Os nomes das deusas Din… Farore… e Nayru…"
Além de gênio, um poeta?

Tudo isso, é claro, não passava de história furada. Miyamoto nunca disse que era fácil pegar a Triforce e também não escreveu poema algum. A Nintendo oferecendo dinheiro? Não preciso nem comentar, não é mesmo!? Mas a Big N não ficou completamente calada nesse período e também resolveu entrar na brincadeira com uma das melhores pegadinhas da história dos videogames.

1º de abril

Em abril de 1999, a Nintendo colocou ainda mais lenha na fogueira e publicou três fotos mostrando Link finalmente conquistando a Triforce. E a zoeira não parava por aí, como brinde também foi divulgada uma imagem de Zora’s Domain totalmente descongelada enquanto o herói do tempo está em sua fase adulta. Se a própria empresa responsável pelo jogo estava dizendo que realmente era possível encontrar a relíquia, por que duvidar? O que muita gente não percebeu foi que as montagens acabaram sendo publicadas em 1º de abril, ou seja, no famoso dia da mentira.




A traquinagem da Big N teve uma repercussão tão grande que a companhia teve que vir a público alguns dias mais tarde, rindo da própria piada, para confirmar que tudo não passava de uma travessura e que realmente não era possível ter a Triforce em Ocarina of Time.

Caçadores incansáveis

Mesmo com todos os indícios apontado para o desfecho negativo das buscas, alguns jogadores não queriam admitir a verdade e continuaram na jornada sem fim. Qualquer coisa no jogo poderia ser uma pista, o pedaço do cenário em forma de pirâmide no deserto, a inutilidade da flecha de gelo ou o maratonista invencível seriam alguns dos elementos que poderiam indicar o caminho para o cobiçado tesouro. Mas a pirâmide não passa de um bug, a flecha de gelo não tem função mesmo e o maratonista realmente é imbatível. Existiram outras infinitas histórias sobre o tema, mas, se formos detalhar todas elas, teríamos assunto para um livro inteiro.

Com o passar do tempo, as pessoas foram lentamente desistindo da missão e para muitas a pá de cal veio quando hackers analisaram toda a programação do cartucho e cravaram que não existia nada escondido por lá. A esperança renasceu quando foi anunciado o remake de Ocarina of Time para 3DS. Será que, dessa vez, a Nintendo colocaria o item no jogo? Entretanto a luz no fim do túnel não passava de um trem vindo em nossa direção, e a remasterização não trouxe nenhuma novidade nesse sentido. O mais incrível de toda essa história é pensar que, mesmo após 18 anos, se procurarmos bem, ainda deve existir um ou outro fã que continua procurando a Triforce no clássico do Nintendo 64.
Como sonhamos em viver esse momento

Uma lenda sem limites

Hoje em dia, quando paramos para refletir sobre todo o alvoroço que esse boato causou, fica difícil de imaginar que algum outro título consiga provocar as mesmas emoções durante tanto tempo. A cada nova informação sobre a Triforce, as vendas do game aumentavam e era mais fácil encontrar os triângulos dourados do que um cartucho disponível nas locadoras. Toda a comoção ajudou a tornar Ocarina of Time um dos melhores, se não o melhor, jogo de todos os tempos. Relembrar como o tema Triforce dominou, por anos, a internet, revistas e conversas entre amigos é apenas uma das incontáveis formas de perceber todo o poder e influência em diferentes mídias que o nome Zelda tem. Uma lenda que conquistou, e soube manter, seu espaço no coração de todos por 30 anos. 

Revisão: Luigi Santana
Capa: Felipe Araujo
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É jornalista e obcecado por games (não necessariamente nessa ordem). Seu vício começou com uma primeira dose de Super Mario World e, desde então, não consegue mais ficar muito tempo sem se aventurar em um bom jogo. Diretor de Redação do Nintendo Blast.
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