Na primeira parte da entrevista, conhecemos mais sobre a origem de Toon Link e como foi a recepção do jogo original pelo ponto de vista dos desenvolvedores. Agora, além de descobrirmos um pouco mais sobre a criação daquele fantástico mundo marítimo, eles falam sobre o processo usado para criar The Legend of Zelda: The Wind Waker HD (que pode trazer esperanças para a criação de outros remakes) e mencionam o novo Zelda para Wii U.
A primeira parte é divina, mas...
Iwata: Eu gostaria de perguntar sobre o conteúdo do jogo. Como é que surgiram aqueles personagens peculiares e o vasto mundo oceânico?Aonuma: Sem muita hesitação, decidimos logo no começo ambientar o jogo através dos mares. Nós gostamos da forma que poderíamos usar o alto mar para projetar as mecânicas desse mundo no jogo e, mais que tudo, pensamos que seria interessante mostrar o mar naquele visual. Acho que atingimos um bom ritmo com todos dando ideias sobre como as ilhas deveriam ser e que tipo de pessoas viveriam nelas.
Iwata: Até para um jogo da série Zelda, em The Wind Waker, apareceram bastantes personagens peculiares que nunca havíamos visto.
Takizawa: Eu lembro que a equipe de planejamento e a de produção de personagens, lideradas pelo Haruhana, se deram muito bem.
Aonuma: Desde Ocarina of time (N64), Haruhana propõe vários personagens excêntricos, mas, em The Wind Waker, foi como se ele tivesse usado um power-up e se libertado totalmente! (risos)
Iwata: Parece que todo o mundo em The Wind Waker foi criado misturando esses ingredientes excêntricos.
Arimoto: Esse é o poder do visual do jogo. Com o visual estilizado, parecendo um anime, não importa o tamanho das cabeças ou se as pernas eram curtinhas, pois nada parecia estranho. Ao contrário, tudo isso passou uma boa impressão de que estava tudo legal.
Aonuma: Exato. Os personagens são muito ricos e expressivos.
Iwata: A expressividade deles realmente são marcantes. Quando se tenta fazer expressões realistas, elas costumam ficar meio estranhas, pois difere da vida real. Mas graças aquele visual, essas coisas não são um problema e pode-se expressar todo tipo de gestos e expressões faciais.
Aonuma: Exatamente. Até Ocarina of Time, era muito difícil expressar algumas coisas até em um simples movimento de boca, por exemplo. Portanto, nos dedicamos muito a isso em The Wind Waker.
Takizawa: Já que os olhos dos personagens ficaram muito maiores, nós quisemos deixar suas expressões faciais mais ricas, aumentando o número de modelos de olhos e bocas. Em algum momento, até conversamos sobre ter raios saindo dos olhos! (risos)
Iwata: Hã? Solatar raios dos olhos?!
Takizawa: Shigeru Miyamoto e Takashi Tezuka disseram que precisávamos dar alguma razão para os olhos serem tão grandes. Porém, eu não acha que soltar raios dos olhos seria uma boa opção.
Arimoto: Nós fizemos de uma maneira que, quando você para, os olhos ficam se movendo, olhando para um lado e para o outro.
Aonuma: É verdade! Foi quando tivemos a ideia de que o olhar do Link daria dicas. Depois usamos isso em Ocarina of Time 3D (3DS), mas a primeira vez foi em The Wind Waker.
Iwata: Ah, então foi assim que isso surgiu.
Aonuma: Até então, na série Zelda, nós mantivemos algumas coisas de fora para que os jogadores jogassem como se eles fossem o próprio Link. Mas em The Wind Waker, embora controle o Link, você o vê objetivamente e joga como se estivesse interagindo com o mundo através do Link. A maneira que ocorre o emprego emocional é um pouco diferente dos outros jogos da série, e conforme você passa mais tempo com ele, isso gradualmente cresce dentro de você.
Iwata: É como aquela propaganda que usamos na época (no mercado japonês) que dizia que o jogo era uma animação que você podia controlar. Depois que o desenvolvimento começou, vocês foram direto até o final, sem nenhuma hesitação?
Aonuma: Nunca hesitamos no nosso desejo de fazer um Zelda completamente novo. Porém, notamos as reações negativas quando ele foi anunciado, e isso nos deixou apreensivos. Mas desenvolver um jogo timidamente teria sido a pior coisa, então continuamos em frente, determinados a ir com tudo para ganhar aceitação.
Iwata: Como foi ver o desenvolvimento pelo lado de fora, Iwamoto?
Iwamoto: Eu não vi muita coisa, mas quando eu comprei o game e joguei, fiquei surpreso com o quanto as animações eram vívidas. Porém, tirando o visual, algumas coisas me incomodaram.
Aonuma: Ele realmente deu algumas opiniões bem duras. Então já que ele é tão atencioso, pedimos para que ele fosse o diretor desta vez.
Iwata: Falando nisso, houve uma conversa nessa época sobre como as primeiras partes do jogo eram divinas, mas depois ele meio que se arrastava. Claro que várias pessoas disseram que era ótimo estar naquele mundo e curtiram jogar até o final, mas acho que aquelas palavras expressavam uma avaliação representativa dos jogadores de The Wind Waker.
Iwamoto: Meu ponto de vista era totalmente o de um jogador. Conforme eu jogava, percebi lugares que me fizeram pensar: “Ah, isso não está certo...” e “Se eles tivessem feito isso, teria sido melhor.” Agora, eu joguei o game novamente e percebi lugares que deveriam ser renovados para os jogadores atuais.
Iwata: Pois é, os tempos mudaram.
Iwamoto: Exato. Então listei esses pontos, ouvi as opiniões dos membros da equipe que o criaram e, por fim, determinei as áreas que precisavam de ajustes.
Aonuma: Quando há um ajuste dessa maneira, o jogo fica drasticamente melhor — tanto que você pensa: “Por que eu não fiz dessa maneira na primeira vez?”
Iwata: Miyamoto costuma dizer que se você fizer um jogo duas vezes, ele fica melhor. Isso é algo para se pensar. Porém, eu sempre digo a ele: “É verdade, mas não costuma dar para fazer isso!” (risos)
Aonuma: Isso é verdade.
Iwamoto: Embora não seja possível para fazer o jogo duas vezes, quando você está chegando na reta final, se tiver um tempo para olhar para trás, irá reparar em algumas coisas.
Aonuma: Eu sei... Você tem toda razão, mas quando se está correndo loucamente, é impossível olhar para trás.
Iwamoto: Eu compreendo também! (risos)
Iwata: Tenho certeza que você fez o seu melhor na época, e realmente acho que a equipe, em todo seu entusiasmo, colocou uma tonelada de ideias e energia no jogo. Se não tivessem, nós não teríamos feito um remake em HD.
Aonuma: E apenas conseguimos ver algumas coisas agora pois 11 anos se passaram.
Takizawa: Uma chance dessas, de olhar para trás com a mente fresca e refazer um game totalmente como fizemos, é muito rara.
Todos: (todos concordam com a cabeça)
Iwata: Mas dessa vez, foi necessário!
Aonuma: As críticas sobre a primeira parte ser divina e o resto muito difícil sempre incomodou. Então, acho que se fosse há cinco anos, eu não teria tido força de vontade para fazer isso.
Arqueologia
Iwata: Mudando de assunto, fazer um software para o GameCube e para o Wii U é algo completamente diferente, desde a mecânica do hardware. Assim, não foi fácil para vocês converter um jogo de GC para o Wii U. Eu gostaria que o Takizawa e o Dotha falassem mais sobre isso.Takizawa: Para começar a nos inspirar, enquanto desenvolvíamos o Wii U, conversamos sobre como nós faríamos com um novo Zelda, e conforme pensávamos sobre isso...
Iwata: Vocês também criaram o Zelda HD Experience.
Takizawa: Exato, isso foi uma evolução natural do Twilight Princess (GC/Wii), embora nós também tenhamos experimentado com um toque mais ilustrado, o contrário de algo que fosse realístico. Tirando isso, fizemos algumas melhorias pegando dados dos Zelda anteriores e simplesmente ligando ao HD do Wii U para ver como ficaria. Dotha realmente se aplicou nessa tarefa.
Iwata: Bom, nós temos uma fartura de imagens, assim um programador pode fazer bastante coisa trabalhando com elas.
Takizawa: É verdade. Pegamos várias versões de Link, do Zelda HD Experience, Skyward Sword (Wii) e The Wind Waker, e colocamos todos com os mesmos ajustes. Usamos praticamente os mesmos efeitos de luz e sombra em cada um, e o Link de The Wind Waker causou um impacto incrivelmente forte. Ele causava um tipo de pressão que não era normal.
Iwata: Ele não estava fazendo nenhum movimento. Apenas sua aparência, parado, o destacou.
Takizawa: Exato! Ele parecia tão natural. Achamos isso incrível, então pegamos os mares e as ilhas de The Wind Waker, colocamos no Wii U e ajustamos as imagens. Isso resultou em um visual fantástico, com um sol vibrante e um contraste maravilhoso.
Iwata: Foram as imagens que mostramos no Nintendo Direct de janeiro?
Takizawa: Exatamente.
Dotha: Eu estava trabalhando nisso, quando, de repente, recebi um e-mail do Aonuma perguntando quanto tempo iria demorar.
Iwata: Aonuma decidiu colocar a mão na massa, perguntando diretamente para quando seria possível o projeto. (risos)
Dohta: Exato! (risos) Para ser honesto, estávamos secretamente calculando isso, então respondi que poderíamos terminá-lo para que fosse lançado no terceiro trimestre de 2013.
Iwata: Aonuma, eu aposto que você ficou surpreso por eles poderem fazê-lo em menos de um ano.
Aonuma: Fiquei sim! (risos) Se falassem que levaria um tempo, eu não acho que teria dito para fazê-lo, mas como iria levar menos de um ano, isso era muito tentador! Além disso, achei que fazer a versão HD de The Wind Waker era importante para observar como faríamos o visual para um novo Zelda de Wii U.
Iwata: Aposto que sim.
Aonuma: Eu fui logo até o Miyamoto e disse: “Podemos fazer isso?” Aí veio aquela conversa sobre o ciclo de Zelda e isso nos deu um empurrão. Já que poderíamos fazê-lo em um tempo curto, ele aprovou o desenvolvimento.
Takizawa: Bom... Posso interromper? Mesmo a equipe dizendo que conseguia fazê-lo, se eu fosse o produtor, eu teria pedido por mais tempo! (risos)
Todos: (risos)
Dohta: A formação da equipe foi um pouco especial dessa vez, com apenas alguns designers da casa. Quando apareceram coisa que poderiam ser feitas com pura mão de obra, como trabalhar nas texturas de alta-resolução e essas coisas, vários designer externos trabalharam para nós. Outras partes, como o aperfeiçoamento, foram praticamente feitas pelo Takizawa, Arimoto e mais alguém, e seguimos com eles três sendo os principais designer.
Iwata: Três designers? Levando em consideração o prazo final, mesmo que tenha sido um remake, corrigir cada bit de dados à mão seria impossível.
Dotha: Exato. Na verdade, os designers da casa que poderiam trabalhar nisso eram limitados, já que era necessário que eles fossem familiares com os dados e direções dos designs originais. Sabíamos que não poderíamos contar com um fluxo de trabalho envolvendo várias pessoas. Então, dessa vez, usamos um método especial. Inventamos uma maneira de converter os dados de GC para o Wii U e fazer com que o visual ficasse melhor, praticamente sem mexer nos dados da modelagem 3D.
Iwata: Isso existia desde o princípio?
Dohta: A princípio não. Nós ainda estávamos adquirindo o conhecimento sobre o Wii U de vários lugares e ajustando as imagens antigas para que elas aparecessem renderizadas de forma limpa para o The Wind Waker HD.
Iwata: Porém esse novo método não faria com que todo o visual ficasse melhor que no GC de uma vez, não é?
Dohta: Não. Era necessário uma atenção especial e individual em alguns momentos. Nós sofremos com vários dados, especulando sobre as intenções dos desenvolvedores no design original e refletindo-as nas configurações do Wii U.
Iwata: Especular sobre as intenções deles... Isso até parece arqueologia!
Todos: (risos)
Takizawa: Bom, era exatamente isso que o Dotha estava fazendo.
Dohta: Pois é. Algumas coisas pareciam terríveis nos dados, porém ótimas no visual original. O trabalhou durou por um tempo enquanto eu repetidamente me matava pensando em como recriar certas coisas no Wii U.
Iwamoto: Começou a aparecer um problema após o outro.
Dohta: Quanto mais fazíamos, mais problemas apareciam.
Arimoto: Este é uma confissão de dez anos atrás, mas aperfeiçoar os dados de design não era um costume daquela época.
Iwata: Exato. As pessoas tinham sua própria maneira de operar. Cada um aperfeiçoava os personagens nos quais ele era encarregado da sua própria maneira.
Dohta: Entendi.
Takizawa: O Dotha costumava dizer: “Takizawa! Isso é totalmente impossível para uma configuração de cenário. Dá uma olhada!” Eu olhava e no fim eram dados que eu mesmo havia criado! (risos) Ao invés de admitir que eu era o responsável, eu dizia: “Uau, que terrível! Você consegue cuidar disso?”
Todos: (risos)
Dotha: E não era apenas os dados. A engine 3D do GC era capaz de gerar aquele estilo de gráfico, então fui ouvir o que as pessoas que conheciam as especificações dessa engine tinham a dizer. Eu andei pela empresa toda até finalmente conseguir fazer os olhos do Link mexerem corretamente.
Aonuma: O grande problema foi como, para o GC na época, eles estavam usando as animações em cel-shading para o visual de uma maneira que nunca foi vista, então cada um trabalhava à mão por conta própria.
Iwata: Eu diria que durante o processo de mudança dessas diversas configurações, alguma coisa acontecia e vocês apenas diziam: “Vamos continuar mesmo assim.”
Dohta: Exato. Para falar a verdade, nós descobrimos que alguns erros eram a causa de como alguns gráficos apareciam na tela. Então, tivemos de incluí-los também...
Iwata: Você recriou os erros?
Dohta: Exatamente. Eu pensava: “O que é que eu estou fazendo?”
Iwata: Entendi. Conforme trabalhava nos gráficos, você recriou até os erros!
Todos: (risos)
Iwamoto: Foi a mesma coisa com as configurações. Havia algumas que ninguém conseguia entender, então nós pedíamos para os programadores analisarem e explicá-las.
Takizawa: Geralmente, costuma-se cuidar disso depois dos designers verificarem até certo ponto, mas já que tínhamos tão poucos, precisamos continuar de uma forma mais indelicada.
Aonuma: Mas agir dessa maneira foi muito importante para The Wind Waker HD. Adotar esse processo realmente nos ajudou muito.
Quer saber como está o resultado final desse belo remake? Veja na última parte da entrevista!