Os reis dos arcades
Impossível falar de qualquer coisa produzida pela Sega nos anos 1980 e 1990 sem fazer algum tipo de associação à Nintendo. No início da década de 1990, ambas as fabricantes viviam em pé de guerra graças a seus consoles 16-bit e utilizavam, com maestria, suas principais armas na disputa pela preferência dos jogadores.
Enquanto o Super NES recebia o apoio de diversas third-parties, o Mega Drive parecia depender das produções da Sega para sobreviver. O grande destaque do console da Nintendo era a facilidade de converter títulos lançados para os arcades. Jogos como Final Fight, da Capcom e Teenage Mutant Ninja Turtles: Turtles in Time, da Konami, conseguiam ser reproduzidos no Super NES com uma fidelidade surpreendente (para a época). Assim, o gênero beat'em up encontrou um lar no console da empresa de Quioto e os jogadores podiam, enfim, dispor da experiência de possuir um fliperama em casa.
Dois jogadores ao mesmo tempo era o diferencial de Streets of Rage |
E foi pensando nesses consumidores (ou jogadores, se você preferir) que a Sega resolveu produzir Streets of Rage, conhecido como Bare Knuckle: Ikari no Tekken no Japão. Streets of Rage em nada inovava, mas apresentava a verdadeira experiência de um jogo de pancadaria nos consoles.
O fato é que a maioria das conversões lançadas para o Super NES deixavam a desejar em algum quesito. Seja o áudio levemente piorado, elementos dos cenários faltando ou mesmo elementos principais da jogabilidade (como o segundo jogador em Final Fight), ainda faltava algo nos títulos do Super NES. E esse não era um problema em Streets of Rage. Criado sob medida para o hardware do Mega Drive, que a Sega tratou de explorar até o último transistor, Streets of Rage era superior em diversos elementos e rapidamente se tornou um clássico.
O sucesso foi tão grande que, pouco mais de um ano depois, a Sega lançou um sucessor. Com diversas melhorias, Streets of Rage 2 elevou a experiência do anterior a um patamar jamais imaginado e surpreendeu ao demonstrar o quão longe o pequeno Mega Drive poderia chegar.
A típica história dos anos 1990
Adivinha quem está de volta? |
Um ano após ser derrotado por Adam Hunter, Axel Stone e Blaze Fielding, Mr. X retorna à cidade a qual causou um verdadeiro caos e sequestra Adam, retomando assim sua organização criminosa.
Preocupado com o irmão mais velho, Eddie 'Skate' Hunter resolve reunir o antigo grupo de heróis que, juntos de Max Thunder, decidem destruir o império de X de uma vez por todas.
Uma sequência justificada
Apesar do enredo nada original, Streets of Rage 2 se destacava pelo elevado grau de polimento. Tudo no jogo se encaixava perfeitamente e servia como uma demonstração de como os jogos do mesmo gênero deveriam se comportar na época.
A diferença mais notável em relação ao primeiro jogo estava no visual. Streets of Rage 2 foi feito em uma nova e melhorada engine e utilizava o raro cartucho de 16 megabits (o dobro do primeiro jogo), o que proporcionou cenários e personagens com um nível de detalhamento surpreendente. Tudo no jogo foi refeito e nem mesmo os sprites originais foram reaproveitados. A cidade, antes genérica, agora era mais brilhante e viva, apesar dos tons fortes que destacavam a orientação matura do título, e até mesmo o background ficou mais interessante.
No entanto, não foi apenas o visual que ganhou uma recauchutada. A trilha sonora, que surpreendeu no primeiro título da série, voltou melhor do que nunca e pôs em cheque a falsa ideia de que o hardware de áudio do Mega Drive era precário. A trilha, composta por Yuzo Koshiro (que era creditado já na tela de abertura), foi inspirada pelo techno e representava bem os cenários explorados pelo título. Da faixa de abertura à faixa de encerramento, é simplesmente impossível citar alguma que não agrade.
Além da trilha sonora, o jogo também acertou nos efeitos sonoros. Apesar de as vozes ainda estarem pouco convincentes, os sons apresentados pelo jogo passavam o nível de realismo esperado pelos títulos da época e não deixavam a peteca cair.
E se falarmos de controles, Streets of Rage 2 era simplesmente impecável. Mesmo com um número bem mais limitado de botões, a equipe de produção conseguiu criar mecânicas ótimas que não colocavam o controle do Mega Drive em uma posição inferior aos demais controles do mercado. Além dos ataques especiais que utilizavam apenas um botão, havia ainda as combinações de botões, que conseguiam tornar o jogo agradável para os jogadores iniciantes ao mesmo tempo que o mantinha complexo o suficiente para os jogadores mais experientes.
Elementos simples, mas valiosos
Assim como a maioria dos jogos da época, Streets of Rage 2 prezava pela simplicidade. Não havia save states, por exemplo, e na maior parte do tempo o jogador devia apenas andar para a direita. Mas isso não transformava Streets of Rage 2 em um jogo impossível ou previsível demais. A dificuldade do título variava do fácil ao muito difícil e colocava à prova as habilidades do jogador. Jogadores menos experientes podiam terminar o título tranquilamente nas dificuldades medianas, mesmo que isso exigisse que não houvessem interrupções entre as oito fases do jogo. Os mais experimentes, no entanto, podiam explorar suas capacidades nas dificuldades elevadas, que eram realmente difíceis. Os níveis no título eram bem nítidos e demonstravam novamente que ele foi feito para ser jogado por todos.
Se falarmos do fator previsível, veremos que Streets of Rage 2 explorava uma série de mecânicas criativas para a época. Além da enorme quantidade de armas brancas disponíveis (que iam das tradicionais facas aos gigantescos canos), algumas mecânicas básicas do jogo o colocavam a frente dos demais títulos da época. A diferença real entre os quatro personagens controláveis, por exemplo, pode parecer algo padrão hoje em dia, mas era um dos destaques de Streets of Rage 2 na época. Cada personagem possuía, além de habilidades distintas, atributos bem específicos que os tornavam individuais e favoreciam o replay. Você podia jogar com o personagem lento e forte ou com o personagem rápido e fraco e devia encontrar a melhor forma de utilizá-los nas ruas.
Os cenários, assim como os inimigos, eram muito variados e impediam qualquer jogador de considerar o jogo cansativo. Os chefes também pareciam mais humanos, com tamanhos que os encaixavam bem no resto do cenário, além de ser possível ver o nome dos inimigos juntos à suas barras de energia, algo dispensável, mas interessante.
A quantidade de elementos que fez de Streets of Rage 2 um dos melhores jogos de seu tempo é simplesmente impressionante e demonstra o quanto a Sega acertou a mão no título. Isso foi refletido nas vendas e nas críticas, que o elegeram um dos melhores lançamentos do Mega Drive. O sucesso foi tão grande que deu origem a um novo título e rendeu diversos relançamentos, do Master System ao Nintendo Wii. Após vinte anos, Streets of Rage 2 ainda é um dos melhores beat'em ups e serve de modelo para o gênero, sendo, sem dúvida, um título obrigatório para todos aqueles que amam uma pancadaria desenfreada nos consoles.
Revisão: Bruno Nominato