N-Business #2: Entendendo o ambiente externo

em 09/10/2009

Na primeira matéria desta coluna , falamos sobre como a Nintendo funciona como empresa. Vimos um pouco de sua história e como a organização ... (por Ricardo em 09/10/2009, via Nintendo Blast)

Na primeira matéria desta coluna, falamos sobre como a Nintendo funciona como empresa. Vimos um pouco de sua história e como a organização entrou no mercado de jogos eletrônicos – e definiu o que é basicamente a empresa hoje. Falamos sobre o que os diversos grupos do ambiente de mercado desejam da Nintendo. Também comentamos que ela é movida por uma filosofia, a qual orienta todas as suas ações e estratégias.

Antes de começarmos a abordar mais detalhadamente as estratégias Nintendo, é importante observarmos o item que antecede esse assunto: o ambiente. Afinal, tudo o que a Nintendo faz precisa ter coerência com o ambiente em que ela está inserida; do caso contrário, estaria fadada ao fracasso. Hoje você vai entender como está formado o ambiente do setor de videogames, como a Nintendo consegue lidar com as incertezas, como são firmadas as relações com as outras organizações, qual a importância destas relações e de que forma elas podem afetar internamente a Nintendo.

O ambiente externo

Quando falamos sobre o ambiente externo à Nintendo, a primeira coisa que deve vir à sua cabeça são as concorrentes, no que diz respeito aos consoles: Sony e Microsoft. Depois, muito provavelmente, você deve pensar nas third parties (como a Square Enix, Sega, Capcom, Electronic Arts, etc) e first parties (como a Retro Studios). Mas será que é só disso que o ambiente de videogames é formado? Publishers, developers e nada mais? Com certeza não.

Num sentido amplo, o ambiente pode ser infinito e ele engloba tudo aquilo que é externo à organização. Dizemos que o ambiente organizacional é definido como todos os elementos que existem fora dos limites da organização e têm potencial para afetar a organização como um todo ou pelo menos uma parte dela. Partindo deste conceito, o ambiente vai muito além das publishers e developers. Você não tem noção de como o ambiente pode ser complexo...

A Nintendo interage diretamente com muitos setores, e todos eles têm um impacto direto na capacidade da organização de alcançar as suas metas. Essa interação forma um ambiente, o qual chamaremos de ambiente de tarefas. O ambiente de tarefas inclui a indústria, matérias-primas, setores de mercado, recursos humanos e setores internacionais. Vamos entender melhor como é formado esse ambiente mais abaixo.

O ambiente de tarefas

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A imagem acima foi inspirada no modelo do ambiente de organização proposto por Richard Daft, um importante nome da teoria organizacional. Ao observá-la, podemos ver que o ambiente externo é extremamente complexo e que há muito setores que podem afetar nas decisões da Nintendo, diariamente. Vamos entender melhor, agora, como cada um desses setores pode interferir na empresa.

40779042_1O setor da indústria é formado primeiramente pelos concorrentes principais da Nintendo: Microsoft e Sony. Neste círculo, devemos pensar também no tamanho da indústria em si e na competitividade que é gerada não somente dentro dela, mas também contra indústrias relacionadas. Na indústria de videogames, sim, podemos incluir as dezenas de publishers e centenas de developers que desenvolvem jogos para os consoles. Chega a ser óbvio afirmar que os jogos são o que mais afetam a Nintendo, afinal são eles que impulsionam as vendas de um console. Estamos falando sobre um mercado de... videogames!

No entanto, seria tolice demais se a Nintendo mantivesse os seus olhos voltados para a indústria de jogos, e esquecesse do mundo afora. Sabemos que a indústria de videogames pertence a uma indústria maior: a indústria do entretenimento. No fim do ano, por exemplo, uma pessoa, em vez de um Wii ou um DS, pode preferir comprar um iPhone. A partir disso, a Apple acaba se tornando uma concorrente indireta da Nintendo – indireta por pertencer à outra indústria, a indústria da telefonia, que hoje também pertence à indústria do entretenimento, afinal a maioria dos novos modelos de celular tiram fotos, tocam música, rodam jogos e possuem aplicativos que permitem ao usuário conectar-se à rede 3G. Da mesma forma, uma pessoa pode preferir comprar álbuns de música no iTunes para tocar em seu iPod/iPhone em vez de comprar jogos para o seu Wii ou DS.

É claro que a concorrência indireta à Nintendo não se restringe aos celulares. A indústria do entretenimento é vasta – você pode pensar na indústria da música, cinema, televisão, teatro, brinquedos, fotografia... tudo aquilo que lhe render o fundamento dessa indústria: a diversão. Até mesmo produtos da indústria relacionada ao esporte e lazer, como as bicicletas, podem ser concorrentes indiretos dos videogames. É por isso que dizemos que, num sentido amplo, o ambiente externo pode ser infinito.

Mas agora você deve estar imaginando que seria inviável pensar individualmente em cada um dos componentes desse ambiente infinito. É por isso que eles são concorrentes indiretos. A Nintendo não pode se preocupar com cada organização das indústrias relacionadas ao entretenimento, mas sim nas indústrias como um todo. A companhia não pode perder o seu foco na própria indústria em que está inserida, nem se esquecer que suas concorrentes mais importantes são a Sony e Microsoft. O que a empresa deve fazer então? Tornar os seus consoles um atrativo aos consumidores, por meio dos jogos. Se você quer comprar um iPhone no final do ano, ótimo, desde que você compre um DS também. Mas se você tem dinheiro para apenas um desses produtos, a Nintendo tenta fazer com que você então prefira levar o DS para casa. A ideia não é brigar com as outras indústrias, mas simplesmente vender o que a organização oferece.

O setor de matérias-primas engloba fornecedores, fabricantes, imóveis e serviços. Já falamos um pouco sobre os fornecedores na primeira coluna. A Nintendo possui relações com diversas organizações, que fornecem peças, insumos e componentes para a produção dos consoles. Não fossem elas, a empresa teria que se virar sozinha para adquirir todos os itens demandados em sua produção, o que tornaria a estrutura da organização mais complexa, a fabricação mais cara e por consequência o preço final ao consumidor seria maior. Em muitas indústrias, o fornecedor pode ser fonte de extrema vantagem competitiva, afinal, a matéria-prima vinda dele afeta diretamente na qualidade do produto final.

184_2828_cedecstoryO setor de recursos humanos está diretamente relacionado ao mercado de trabalho, agências de emprego, universidades, entidades de treinamento, funcionários em outras empresas e sindicalização. Sabemos que a Nintendo quer ter os melhores profissionais como colaboradores. Você se lembra da filosofia Nintendo, abordada na primeira coluna? A última frase desta filosofia diz o seguinte: “Ao desafiar a competitiva indústria de jogos, que coerentemente exige novos e inovadores produtos, a Nintendo vai se esforçar para expandir o seu negócio e aumentar a renda e o lucro, aproveitando o fato de ser a única fabricante de consoles com um poderoso time de desenvolvimento de softwares próprios.”

Esse “poderoso time” só existe porque dele fazem parte os melhores profissionais do mercado. Profissionais esses que foram capacitados e qualificados em universidades e escolas, ou que realizaram cursos que lhe permitiram incrementar o currículo e atrair o interesse da organização. Sabemos que o mercado de videogames é caracterizado por constantes mudanças – os ciclos de vida dos produtos são curtíssimos: o GameCube e o Nintendo 64 tiveram um ciclo de 5 anos. Ainda que analistas prevejam um ciclo mais extenso para a geração atual, os profissionais não podem se acomodar. Eles precisam constantemente estar abertos às novidades, para acompanhar as inovações do mercado.

mario_moneyO setor de recursos financeiros também tem a sua importância. É através dele que a Nintendo consegue o capital que irá bancar seus futuros projetos e suas próprias atividades, seja a criação de novos jogos ou o desenvolvimento dos sucessores do Wii e DS. Esse dinheiro pode vir do mercado de ações, bancos, poupanças e empréstimos ou investidores. A visão de que é mais seguro bancar seus projetos com capital próprio está completamente equivocada. Com certeza o lucro da organização é reinvestido nela própria, mas o capital de terceiros também financia uma grande parte de suas atividades.

No setor de mercado, voltamos a nossa atenção aos consumidores, clientes e usuários potenciais dos produtos e serviços da Nintendo. Afinal do que seria o ambiente sem a presença do consumidor? O cliente é a razão de existência não apenas da Nintendo, mas de qualquer organização do planeta.

O setor de tecnologia aborda as técnicas de produção, ciência, computadores e tecnologia da informação. Conforme foi dito anteriormente, a indústria está sempre se renovando, sempre buscando melhorias, mais eficiência, e mais eficácia. A inovação não consiste apenas nas pesquisas e no desenvolvimento de novos consoles. Percebemos, por exemplo, que os jogos lançados próximos ao final do ciclo de vida de um console possuem gráficos e jogabilidade potencialmente superiores àqueles lançados no início do ciclo de vida, quando as técnicas de produção ainda estavam a ser aperfeiçoadas.

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O setor de condições econômicas também tem um impacto enorme na organização. Analisamos aqui a economia, se ela está em recessão, como anda a taxa de desemprego, a taxa de inflação, a taxa de investimentos e o ritmo de crescimento econômico.

Já o setor governamental está relacionado ao Estado, às leis e regulamentações federais, impostos, sistema judiciário e processos políticos. A Nintendo, no Japão, é uma organização pública, e jamais praticará ações que sejam contrárias às políticas do governo. Entendemos aqui que é fundamental que não apenas a Nintendo, mas qualquer organização, obedeça às leis de seu país, e dos países em que ela estiver, repudiando portanto a concorrência desleal e a infração à ordem econômica.

O setor sociocultural diz respeito aos valores, crenças, educação e religiões que regem a sociedade. A Nintendo, como uma organização que faz parte do contexto internacional, precisa atentar para não desrespeitar os valores e crenças de nenhum país, já que isso seria péssimo para a sua imagem. Para isso, é imprescindível que a empresa esteja fundamentada na ética. A ética deve mover o trabalho.

Movimentos ecológicos e sociais também fazem parte deste setor – que é de grande preocupação para a Nintendo. Comparando, por exemplo, o consumo de energia dos consoles de mesa, percebemos que o Xbox 360 consome 187 watts/hora e o PS3 Slim consome 96 watts/hora, enquanto que o Wii consome apenas 19 watts/hora. Ou seja, de longe, o Nintendo Wii é aquele que causa o menor impacto ambiental.

Finalmente temos o setor internacional, que fala sobre a entrada em mercados estrangeiros, regulamentações e taxas de câmbio. Vimos na primeira coluna que a Nintendo está inserida em todos os continentes do planeta, quer representada por outra empresa, quer por instalações sob a sua responsabilidade.

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Você já deve ter percebido que os setores que formam o ambiente de tarefas têm um alto grau de relação entre si. Ora, como é possível avançar tecnologicamente sem recursos financeiros? E é impossível desvincular esse setor das condições econômicas. E assim por diante.

Como lidar com a incerteza?

Um ambiente tão complexo e que diariamente influencia a organização certamente pode gerar uma grande incerteza ambiental. Para entendermos o grau dessa incerteza, devemos pensar em duas questões:

  • Com quantos elementos (de cada setor) a Nintendo negocia regularmente?
  • Com que rapidez esses elementos mudam?

Apesar da perspectiva ampla ao ambiente fazer com que ele tenda para o infinito, os setores isolados não possuem uma complexidade tão grande no que se refere à quantidade de elementos. O setor da indústria sim, talvez seja mais incrementado por conta do grande número de players na indústria de videogames, e por todas as outras indústrias que a cercam e acompanham. Mas se observarmos o setor de matérias-primas, por exemplo, vemos que a Nintendo possui suas relações sólidas com fornecedores e não precisa ficar alterando contratos o tempo todo. Já o setor de tecnologia é bem limitado no que diz respeito ao acesso. Não é qualquer empresa que consegue dominar as técnicas que as participantes atuais da indústria dominam – do caso contrário, teríamos à disposição no mercado produtos mais inovadores e avançados concorrendo com os atuais.

Os elementos externos à Nintendo, portanto, formam um ambiente complexo, mas eles por si só não fazem muito barulho. São unindo-os que conseguimos ter a noção das dimensões extraordinárias que o ambiente pode formar. Ainda assim, nós devemos concordar que a mudança é frequente e ocorre de forma imprevisível. Quem imaginaria, por exemplo, que a Nintendo fosse adotar o sensor de movimento em seu novo console? Se Sony e Microsoft tivessem previsto isso, talvez o cenário do mercado atual fosse bem diferente...

O ambiente dominado por essa mudança frequente mas imprevisível cria uma condição de incerteza elevada-moderada. E para lidar com isso, há uma série de estratégias que a Nintendo pode adotar:

  • Estabelecer uma estrutura orgânica dentro da empresa, priorizando o trabalho em equipe, que seja participativo e descentralizado. O gerenciamento orgânico permite que os funcionários contribuam para as tarefas comuns diárias, tarefas essas que são ajustadas e redefinidas por meio da própria equipe de trabalho, sem a necessidade de um gestor superior que tome todas as decisões por ela. Isso faz com que a hierarquia de autoridade seja reduzida: há menos controles e menos regras. A liberdade propicia a criatividade dos funcionários: eles podem pensar, e não agem como meros robôs que se preocupam com as mesmas coisas, as mesmas regras, todos os dias. Em qualquer parte da organização, o conhecimento é interativo.
  • A estrutura orgânica só faz sentido se houver a administração de fronteira. Ela ocorre quando a empresa detecta e traz para dentro dela informações valiosas sobre mudanças no ambiente. A própria organização também pode enviar informações para o ambiente externo, de forma que essas informações possam apresentar a empresa de maneira favorável.
  • Também é importante a organização esteja estruturada numa grande quantidade de departamentos. Frente à incerteza ambiental, um departamento da Nintendo não pode cuidar de mil assuntos sozinho. Por isso há o departamento de produção, de pesquisa e desenvolvimento, de gestão de pessoas, de finanças, de marketing, de logística, de assuntos internacionais, de assuntos jurídicos, de contabilidade...
  • Os departamentos precisam ter o seu planejamento orientado para uma alta velocidade de resposta. Os diretores da Nintendo constroem diversos cenários, baseados na previsão de várias mudanças que poderiam afetar a empresa. Assim, eles podem descobrir em que ações a organização poderia trabalhar caso algum dia algum desses cenários se torne realidade.

As conexões organizacionais

imageTalvez a essa altura do campeonato, você já saiba que em qualquer ambiente, em qualquer indústria, uma organização que trabalha em cooperação mútua com várias outras organizações consegue uma vantagem competitiva muito grande em relação à empresa que trabalha sozinha e isolada. Na indústria dos videogames, isso é muito visível especialmente na relação das fabricantes de consoles com as third parties. A atração das thirdies para os consoles é vital para a sobrevivência destes. Recentemente, o Wii ganhou Dragon Quest e Munster Hunter. Dias atrás, você viu aqui no Nintendo Blast a confirmação de Epic Mickey para o console. A decisão de trazer títulos deste porte não brota da noite para o dia. Ela é fruto de uma série de fatores, e entre eles está a relação que a developer tem com a Nintendo.

Podemos considerar, inclusive, que alianças estratégicas podem ser formadas entre essas empresas para ganhar vantagem em relação aos concorrentes. Um bom exemplo está em Metroid: Other M, onde Nintendo e Team Ninja se unem para o desenvolvimento do novo jogo da franquia, enquanto a Retro Studios mantém o seu foco em algum outro projeto secreto – e que esperamos que venha a ser de grande agrado de nós consumidores.

Mario_Party_8Na próxima coluna...

Falaremos um pouco mais sobre o ambiente, mas desta vez o macroambiente será o foco. Vamos conhecer a abordagem da estrutura PESTEL, a importância da análise SWOT, quais são os principais condutores de mudança no ambiente e vamos entender melhor como funcionam as fontes de competição por meio da estrutura das cinco forças de Porter. Até lá!

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Ricardo tem 19 anos, é estudante de Administração, mora em Curitiba e ama tanto música pop que decidiu dedicar o seu tempo livre para a criação de um blog só sobre o assunto! Vícios atuais: Ladyhawke, Ke$ha, Little Boots, La Roux, VV Brown, Frankmusik e Dan Black. Sua cor preferida é lilás e seu filme preferido é O Poderoso Chefão.
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