Você em algum momento já parou pra pensar na Nintendo como uma organização? Enxergar as organizações pode ser uma tarefa difícil. Nós podemos perceber os seus sinais externos, como um edifício imponente e uma estação de computadores, mas a organização como um todo é vaga e abstrata, e pode estar espalhada em diversas localidades, até mesmo ao redor do mundo, como é o caso da Nintendo. A empresa vai muito além do prédio bonito, que você vê na foto ao lado, ou da dezena de escritórios internacionais que representam a Nintendo ou são controlados pela própria. Há toda uma entidade social por trás, que é orientada por metas e objetivos, projetada como um sistema de atividade estruturado e coordenado, e intrinsecamente ligada ao ambiente externo.
Nós estamos rodeados por organizações. Elas são tão comuns que as tomamos por algo que sempre esteve ali. Mal nos damos conta que nascemos num hospital, somos registrados num cartório, estudamos em escolas e nos formamos em universidades, crescemos com alimentos produzidos em fazendas corporativas, vamos ao médico que faz parte de uma equipe ou consultório quando ficamos doentes, compramos uma casa que foi construída por uma construtora e vendida por uma imobiliária, pegamos dinheiro emprestado ou fazemos as nossas poupanças num banco, recorremos à polícia e aos bombeiros quando algum problema acontece, e passamos em média 40 horas por semana trabalhando numa organização.
E a Nintendo, faz parte disso? É claro que sim. O objetivo desta e das próximas colunas é trazer a você, leitor, uma visão da Nintendo como organização corporativa. Abordaremos os mais diversos temas como o ambiente de empresas do qual a Nintendo faz parte, as estratégias da Nintendo e como a inovação e sua cultura organizacional estão conectadas. Também dedicaremos este espaço para falar (e muito!) do marketing da empresa, em como os canais auxiliam a logística da Nintendo e também vamos discutir a sua participação no mercado financeiro. Tudo isso não parece interessante?
A importância da Nintendo hoje
Todos sabemos que hoje a Nintendo é líder da indústria de videogames. A empresa possui ao todo 4.130 funcionários e teve um lucro líquido superior a 3 bilhões de dólares no ano passado. A Nintendo está aí para nos entreter, e isso faz total sentido com a sua filosofia (falaremos dela mais adiante).
Com todos esses recursos, a empresa pode plenamente atingir suas metas e alcançar os resultados desejados para o ano de 2009. Para isso, a Nintendo sabe que vai ter que produzir bons jogos e oferecer os seus serviços com eficiência. Ao mesmo tempo em que há um departamento de produção preocupado com a qualidade dos produtos Nintendo, há um setor na organização voltado inteiramente à pesquisa, que todos os dias tenta encontrar novos meios de facilitar a inovação. Somente assim a Nintendo consegue utilizar modernas tecnologias de produção e informação.
A Nintendo faz parte de um ambiente de organizações. Nele não estão apenas as empresas concorrentes, mas todas aquelas que fazem parte da cadeia da Nintendo. Por cadeia nesse contexto, entenda o aglomerado de atividades da empresa, desde a criação do produto (os jogos e os consoles, por exemplo), até a chegada deles nas prateleiras das lojas ou em sua própria casa se você fez a compra pela Internet. Imagine a Nintendo como o centro desta cadeia. Atrás ficam todas as empresas ligadas à produção. Para os consoles, temos desde os fornecedores de peças e chips (como a IBM e a Mistumi), às publishers e developers de games como a Capcom, Square Enix e a Electronic Arts, que podem possuir estúdios próprios, mas também estúdios terceirizados, que são outras empresas! Você consegue ter uma noção do quanto esse ambiente é complexo? Mas há ainda a parte de frente da cadeia, em que é feita a distribuição dos consoles e dos jogos para as redes de varejo, e aí há mais organizações atuando para que o transporte desses produtos seja rápido, eficiente e com o menor custo possível.
Um ambiente tão complicado como o segmento dos videogames naturalmente tem mudanças o tempo todo. Um dia, um estúdio divulga a criação de uma nova engine, no outro, pode ter o anúncio de uma nova franquia com novos conceitos de jogabilidade. É crucial para qualquer empresa desse ambiente – e aqui incluímos também a Nintendo – estar atenta às novidades e saber se adaptar às transformações. Mas agora você deve estar se perguntando: será que a Nintendo é um agente do ambiente que só se adapta às mudanças? Será que a Nintendo não é uma própria influenciadora das empresas que a cercam? A resposta todos já sabemos. É óbvio que sim! E basta observar o console atual de mesa da Nintendo, o Wii, e o seu controle revolucionário. O sensor de movimentos – da maneira que a Nintendo impôs, com um portfólio de jogos que atraiu novos consumidores – mudou completamente o conceito de videogames no mercado. O que teria acontecido se o Wii Remote fosse um controle analógico, como no Xbox 360 e no PlayStation 3? Provavelmente ninguém hoje saberia da existência do Project Natal, e talvez ele nem mesmo tivesse sido pensado até o momento.
Perspectivas históricas
A Nintendo foi criada em 1889. No dia 23 de setembro deste ano, portanto, ela vai comemorar 120 anos! A imagem acima é uma linha do tempo dos produtos da empresa. Você pode ver que ela começou produzindo cartões artesanais de um tipo de baralho chamado Hanafuda, e seu sucesso na área de jogos eletrônicos só começou mesmo em 1983 com o lançamento do Famicon (Family Computer) – obviamente que as condições tecnológicas do século XIX não permitiram que as pessoas pudessem jogar Donkey Kong naquela época!
Por que a Nintendo conseguiu sobreviver por tanto tempo? Quais foram as grandes sacadas? Qual o segredo dessa companhia japonesa?
- Eficiência é tudo: um dos principais fundamentais para a administração de qualquer empresa é que as decisões sobre as organizações e os projetos devem estar baseadas em estudos precisos sobre as situações individuais. Quando na década de 70 a Nintendo se viu ameaçada pelas fabricantes de jogos eletrônicos como a Atari e a Bandai, a decisão de entrar definitivamente para este ramo não foi feita por puro impulso ou instinto. Ela requereu uma construção detalhada de cenários para a organização ter certeza de que obteria sucesso no mercado. Além disso, houve todo um planejamento por trás que consistiu no desenvolvimento de procedimentos-padrão precisos para a realização das tarefas (criação dos aparelhos, divulgação, distribuição, venda, entre outros), seleção de trabalhadores com as habilidades adequadas (Shigeru Miyamoto entrou para a Nintendo em 1977) e treinamento nesses procedimentos-padrão.
- Jamais se esquecer do ambiente: no momento em que a Nintendo decidiu entrar para o mercado de jogos eletrônicos, toda a sua estrutura (o organograma) foi alterada. Esse foi um trabalho de contingência. Para que as organizações sejam eficazes e deem certo, é fundamental que haja um ajuste perfeito entre a sua estrutura e as condições no ambiente externo. Afinal, o que funciona num cenário pode não funcionar em outro. Não existe um único caminho perfeito. Tudo depende.
O que cada grupo deseja da Nintendo
Ao definir seus objetivos e se projetar para garantir a eficácia, a Nintendo precisou considerar as necessidades e os interesses de todas as partes detentoras de interesse. Vamos dar uma olhada na imagem a seguir:
De modo geral, é bem difícil para satisfazer simultaneamente às demandas de todos os grupos. A Nintendo pode, numa hipótese, conseguir satisfazer a todos os seus clientes, mas ter dificuldades com os credores (de quem ela emprestou dinheiro) ou o seu relacionamento com os fornecedores é desfavorável porque o poder de barganha deles é muito alto (quando o poder de barganha de um fornecedor é muito alto, é difícil para a Nintendo negociar preços, logo ela fica “nas mãos dele”. Se não fosse por isso, os custos de produção poderiam ser menores. Fornecedores conseguem ter alto poder de barganha quando eles são os únicos que produzem um determinado componente com qualidade).
Às vezes pode acontecer inclusive de um grupo ter interesses que entrem em conflito com os interesses de outro grupo. E aí, o que fazer nessa situação? A Nintendo luta para satisfazer pelo menos os interesses mínimos de todos os grupos. Quando qualquer um estiver seriamente insatisfeito, ele pode retirar o seu apoio e isso prejudica o desempenho futuro da organização. No entanto, é razoável nós deduzirmos de que não é possível agradar a todos fazendo a mesma coisa. Cada um tem seus próprios interesses, por isso a política da Nintendo precisa ser a mais democrática possível.
A filosofia Nintendo
“[A Nintendo vai continuar correndo atrás da] Expansão do público gamer, pondo sorrisos nos rostos de muitas pessoas por oferecer um divertimento novo em folha que qualquer um pode desfrutar, sem levar em conta a idade, gênero, ou experiência como jogador. [A Nintendo espera que o DS seja] um aparelho que enriqueça a vida diária de seu dono. A estratégia da Nintendo é acelerar o ritmo atual de vendas. Passando de “todas as famílias devem ter” para “todos devem ter”. [É esperado que o Nintendo Wii seja] um aparelho que todos queiram comprar, que provoque sorrisos adjacentes nos rostos das pessoas [ao encorajar a comunicação entre os membros da família na sala de estar e oferecer diversão por isso]. Ao desafiar a competitiva indústria de jogos, que coerentemente exige novos e inovadores produtos, a Nintendo vai se esforçar para expandir o seu negócio e aumentar a renda e o lucro, aproveitando o fato de ser a única fabricante de consoles com um poderoso time de desenvolvimento de softwares próprios.”
Declaração da companhia Nintendo.
A declaração acima é o que move a Nintendo neste momento. Ela está exposta para funcionários, clientes, investidores, fornecedores e concorrentes atuais. Ela mostra o que é a Nintendo e o que ela pretende alcançar. A partir dessa filosofia, grupos que tiverem se identificado com o propósito estabelecido podem se juntar à empresa. A filosofia Nintendo tem um papel crítico para a organização. Nada – absolutamente nada – que a Nintendo fizer irá contrariá-la.
Estrutura organizacional da Nintendo
Finalmente, antes de finalizarmos essa matéria, vamos ter uma ideia das dimensões da Nintendo.
A matriz da empresa está localizada em Kyoto, no Japão. A Nintendo tem escritórios em Redmond (EUA), Richmond (Canadá), Großostheim (Alemanha), Scoresby (Austrália), Suzhou (China) representa pela iQue, Costa del Este (Panamá) representada pela Latamel, São Paulo (Brasil) também representada pela Latamel, Taiwan e África do Sul (como Core Gaming Systems).
O atual presidente global e CEO (diretor-executivo) é Satoru Iwata (foto). O CCO (diretor de curso) e presidente da Nintendo of America é Reggie Fils-Aime. O presidente da Nintendo na Europa é Satoru Shibata. E Shigeru Miyamoto é o designer de games com maior renome da companhia, com um alto poder de decisão dentro da empresa.
Divisões da Nintendo
- Nas Américas: Nintendo of America (NOA) e Nintendo of Canada.
- Na Oceania: Nintendo of Australia
- Na Europa e África: Core Gaming Systems Ltd. (África do Sul), Nintendo Benelux, Nintendo Spain, Nintendo of Europe (NOE), Nintendo France, Nintendo Germany, Nintendo Italy e Nintendo UK.
- Na Ásia: Nintendo Company (Japão), Nintendo Honk Kong, Nintendo of Korea (NOK), Nintendo Phuten Company (Taiwan) e Maxsoft Pte. (sul da Ásia Oriental)
Pesquisa & Desenvolvimento
- Nintendo Technology Development
- Nintendo Integrated Research and Development
- Nintendo Technology and Engineering
Pesquisa de marketing e vendas
- HFI Inc.
- NES Merchandising Inc.
- NHR Inc.
- Nintendo Research, Inc.
Empresas afiliadas
- The Seattle Mariners (time de beisebol de Seattle)
- iQue (distribuição da Nintendo na China)
- The Pokémon Company
- Siras Inc. (segurança em sistema de informações)
- Latamel (distribuição na América Latina)
Developers first-party
São estúdios subsidiados pela Nintendo ou que ela possui um controle superior a 51%.
- Brownie Brown (Heroes of Mana)
- Intelligent Systems (WarioWare, Paper Mario, Fire Emblem)
- Monolith Soft (Disaster: Day of Crisis)
- EAD (Mario Kart, The Legend of Zelda, Super Mario Galaxy, Big Brain Academy, Wii Sports, Wii Fit, Animal Crossing)
- NST (Metroid Prime Hunters)
- SPD (Rhythm Heaven, WarioWare, Metroid: Other M junto com a Team Ninja)
- Project Sora (Super Smash Bros. Brawl)
- Retro Studios (Metroid Prime)
Developers second-party
Estúdios que criam jogos exclusivamente pra Nintendo por um contrato assinado.
- AlphaDream (Mario & Luigi)
- Ambrella (Pokémon Dash)
- Camelot (Mario Golf, Mario Tennis, Golden Sun)
- Game Freak (Pokémon)
- Genius Sonority (Pokémon Battle Revolution)
- HAL Laboratory (Kirby, Super Smash Bros.)
- NDCUBE (F-Zero)
- Noise (Custom Robo)
- Paon (DK: Jungle Climber)
- skip (Captain Rainbow)
Outras empresas
- Fukuei Inc. (suporte na indústria)
Com tantas equipes trabalhando com a Nintendo, é fundamental que a sua estrutura seja a mais horizontal possível, assim a organização consegue ter o foco na aprendizagem e a comunicação flui num fluxo rápido, face a face. Mas esse é a assunto para outra coluna...
A coluna de hoje serviu como introdução aos assuntos futuros. Espero ter conseguido passar um pouco do que é a Nintendo como organização corporativa.
Na próxima coluna...
Vamos falar sobre o ambiente de organizações que trabalham com videogames! Como anda o setor atualmente? Como a Nintendo consegue lidar com a incerteza? Como são firmadas as relações com outras empresas, qual a importância delas, e como elas afetam a Nintendo?
Não percam!!!